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Fábio Rodrigues Pozzebom/Agência Brasil

Novo governo vai enfrentar desinformação em diversas frentes

Fábio Rodrigues Pozzebom/Agência Brasil
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Responsável por realizar um diagnóstico da gestão passada e propor pontos para os próximos quatro anos, o chamado governo de transição finalizou seu trabalho na semana passada e a desinformação apareceu em diversas áreas. No Grupo Técnico de Comunicações, por exemplo, a análise envolveu o cenário da desinformação no Brasil e na gestão anterior. “Ao longo do governo Bolsonaro, o governo utilizou as redes sociais e até mesmo a própria estrutura governamental para promover desinformação, discurso de ódio e ataque a jornalistas. Essa avaliação crítica está muito presente no nosso relatório”, revelou Helena Martins, relatora do GT e professora na Universidade Federal do Ceará, em entrevista ao *desinformante.

Foram  33 grupos de trabalho e mais de cinco mil pessoas atuando com contribuições em todas as áreas. O coordenador dos grupos temáticos da equipe de transição do governo, ex-ministro Aloizio Mercadante, disse que os resultados expressos nos relatórios são “o melhor ponto de partida que o ministro poderá ter para iniciar a sua gestão”, reforçando a precisão dos diagnósticos.

O Grupo de Comunicações pontuou que, durante o governo Bolsonaro, em vez de políticas públicas para combater a desinformação, existia uma perspectiva de instrumentalização das redes sociais para a disseminação de informações falsas. “De uma forma geral, a gente conseguiu realmente avançar nessa compreensão de uma produção em larga escala de desinformação na sociedade”, colocou Martins. A percepção foi similar no Grupo Técnico de Comunicação Social, que lida no âmbito da Secretaria de Comunicação Social. Algumas informações sobre contratos foram divulgadas pelo deputado federal André Janones e confirmadas por Helena Martins.

Com essa leitura, a equipe que produziu relatórios para o próximo Ministro das Comunicações – que ainda não foi divulgado – destacou em primeiro lugar a necessidade de incluir o MiniCom no debate digital. “Incrivelmente o ministério não tem feito isso hoje, ele se volta ainda muito para um olhar sobre a infraestrutura de telecomunicações, mas para várias questões associadas ao digital, como proteção de dados e desinformação, ficou completamente alheio no último período, o que fala muito sobre a visão limitada e instrumentalizante que o governo desenvolveu”, concluiu Martins.

No âmbito da Secom, a perspectiva é a mesma: é preciso incluir o órgão no debate e contribuir a partir de ações que envolvam o governo federal. Para isso, também se propõe o estabelecimento de iniciativas de combate à desinformação e promoção da liberdade de expressão e de imprensa. 

A proposta do  GT de Comunicações é a criação de uma Secretaria de Serviços e Direitos Digitais, que teria como uma das atribuições o desenvolvimento das políticas públicas de combate à desinformação, como o incentivo do letramento midiático, por exemplo, estimulando o desenvolvimento de habilidades digitais. As recomendações não são vinculativas, ou seja, o futuro chefe da pasta deve avaliar o que será posto em prática. Para a relatora do GT, a medida é importante para que a sociedade tenha mais resiliência e compreenda como funciona o ambiente digital para proteção contra a desinformação, mas também contra outros problemas como vazamento de dados. A sugestão parte da experiência de outros países que apostam nesse sistema.

Além disso, as recomendações trazem outros temas relacionados à radiodifusão e comunicação pública. Em relação ao combate à desinformação de forma específica, um ponto foi central nesse debate: regulação de plataformas digitais.

Para Martins, há uma clara percepção sobre a necessidade de avançar no aspecto legislativo para que não se fique “improvisando” respostas, como o que ocorreu no pleito deste ano e para que existam regras robustas para as empresas que controlam as comunicações digitais. “A situação dramática que a gente tem vivenciado pede que isso seja tratado com centralidade pelo governo e por isso nós conseguimos apontar para um debate de regulação de plataformas nos primeiros 100 dias do governo”, pontuou. 

A equipe não esboçou uma proposta de regulação, mas apontou a necessidade e os contornos necessários para a legislação, destacando a necessidade de um debate multisetorial. Helena Martins indica a necessidade de uma consulta pública para que seja um processo participativo com diálogo. No entanto, a equipe de transição aponta que é importante olhar para outras leis já aprovadas, como o DSA e o DMA na União Europeia, e compreender o que pode ser adotado levando em conta as peculiaridades do Brasil.

A pauta da regulação vem sendo cobrada também por entidades da sociedade civil e acadêmicos. Em uma carta aberta ao novo governo, a Coalizão Direitos na Rede reforça que “não é mais possível que a sociedade brasileira fique refém do discurso que visa interditar a necessidade de democratizar o setor e atualizar sua regulação, quando esta agenda vem sendo implementada em todo o mundo” e aponta a necessidade de medidas.

Grupo Técnico de Justiça

O debate sobre a necessidade de regulação das plataformas e combate à desinformação também se colocou com intensidade no Grupo Técnico de Justiça e já vem se desenhando no Ministério da Justiça, que terá Flávio Dino à frente. Uma das primeiras ações foi a criação de uma assessoria de direitos digitais, que será comandada pela advogada e presidente da Comissão Especial de Proteção de Dados do Conselho Federal da OAB e da OAB-RJ, Estela Aranha

Em entrevista ao programa Roda Viva nesta segunda-feira (19), Dino respondeu sobre a regulação. “Estamos na iminência ou do dilúvio ou de uma guerra nuclear, só que na sua dimensão digital. A questão da segurança digital é vital para a sociedade, é vital para a sobrevivência da democracia”, respondeu o futuro ministro.

Grupo Técnico de Educação

A desinformação também foi pauta no GT de educação, principalmente no que tange ao papel da desinformação e das plataformas digitais na radicalização e extremismo. Em entrevista ao canal da Associação Nacional dos Programas de Pós-Graduação em Comunicação, Daniel Cara, professor da Faculdade de Educação da USP e um dos coordenadores do GT Educação, levantou o problema. 

“Uma das questões é que a falta de educomunicação amplia esse problema, alimenta esse problema porque a falta de uma educação crítica em termos de mídias gera um déficit em relação à própria consciência sobre o que é uma informação verídica e o que não é uma informação verídica, ela facilita o trabalho de aliciamento dos grupos neonazistas, nazistas e fascistas em relação a adolescentes e jovens”, disse Cara, relembrando, por exemplo, ataques recentes a escolas.

Esse processo foi identificado em um relatório de 51 páginas chamado “O extremismo de direita entre adolescentes e jovens no Brasil: ataques às escolas e alternativas para a ação governamental”. O diagnóstico mostra os meios de cooptação pelas redes, dados sobre os ataques e indica ações a serem desenvolvidas pelas escolas. “No processo de formação contra a cooptação de estudantes por de grupos ultrarreacionários, além da ação da rede integrada e multidisciplinar há necessidade de um trabalho pedagógico em educação crítica da mídia e de combate à desinformação”, pontua o texto.

Grupo Técnico de Saúde

A desinformação também foi diagnosticada como um dos maiores inimigos da saúde. O Brasil passa por um momento de grande hesitação vacinal e, segundo a Sociedade Brasileira de Imunizações (SBIm), entre os motivos apontados estão a desinformação, falta de informação e crescimento do movimento antivacina.

Mas não é só a desinformação que atrapalha a atuação do próximo ministério, mas também a falta de informações. Arthur Chioro, ex-ministro da Saúde e membro do GT, disse em entrevista à CNN que dados sobre vacinas, por exemplo, não existem e nem foram fornecidos, deixando o planejamento às escuras: “O quadro atual do Ministério da Saúde é um verdadeiro desastre. Dados sensíveis como estoque e prazo de validade de vacinas não existem, eles não têm essa informação”. 

Chioro destaca que um dos principais desafios do ministério será apurar as informações e encontrar dados precisos. Entre as 10 medidas sugeridas para os 100 primeiros dias de governo está nas questões relacionadas à informação, além de reestruturar o Programa Nacional de Imunização para recuperar as taxas vacinais.

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