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Pontos de vista

acervo pessoal

jul 11, 2022 | pontos de vista

A internet do futuro precisa brotar daqui (também)

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Uma agenda do futuro da internet e das redes sociais precisa ter nossa cor, nossa cultura e nossas demandas. A gente já sabe disso, mas a vinda da engenheira e cientista de dados Frances Haugen ao Brasil, na última semana, teve um simbolismo enorme do fracasso deste modelo branco do Vale do Silício do Norte global que não contempla com respeito e segurança o resto do mundo. Suas denúncias estampadas pelo Wall Street Journal e depois em centenas de jornais mundo afora, nada mais são que a comprovação de um poder que existe porque precisa de cidadãos de segunda classe, como o Sleeping Giants Brasil se refere a nós quando enxergamos a diferença de tratamento dada pelas grandes empresas a usuários de lá e de cá.

Não é um problema novo, é a própria ordem do capitalismo. A notícia boa é que as engrenagens estão expostas. Quando Frances Haugen diz que nós precisamos fazer nossas próprias perguntas e que as empresas de internet não fazem mais do que obrigação em mostrar seu funcionamento, é como trocar os óculos e aquele grauzinho a mais permite enxergar com mais nitidez nossos direitos e poderes como cidadãos e consumidores de plataformas onipresentes que nunca pediram licença para entrar nas nossas vidas.

Ela mesma – Frances Haugen – não nos deu o caminho das pedras, porque no mundo digital cada cultura precisa entender onde o sapato aperta. Se aqui o que pega é a violência política de gênero, precisamos reunir e fortificar essa narrativa e deixar que os detentores de decisões das grandes plataformas saibam dos danos causados ou, pelo menos, potencializados através das redes sociais a este grupo vulnerável.

Se o algoritmo não entende bem quando um brasileiro mineiro está xingando ou fazendo piada, ele precisa aprender e isso não é nenhum favor se levarmos em conta o crescimento obtido pelas redes sociais no Brasil, especialmente as empresas do grupo Meta, que tem aqui um mercado muito maior e promissor do que nos Estados Unidos.

O uso da Inteligência Artificial precisa ser regulamentado de modo a não cometer injustiças e a União Europeia já entendeu e colocou isso no papel, “o que é ilegal no mundo offline, é também no mundo online”, prioriza o Digital Services Act (DSA).  A moderação de conteúdo em línguas como português e espanhol, com todas suas nuances e dialetos, é urgente da mesma maneira. Frances trouxe com ênfase a noção de que precisamos nos posicionar diante das big techs. Ninguém fará isso por nós. Sociedade civil, governos, judiciário, parlamentares, a briga exige ações conjuntas e articulações entre nós com a potência de fazer chegar a quem é de direito. E caso não nos atendam, que saibamos que a língua do dinheiro não falha. Desmontar o financiamento de campanhas desinformativas e com discurso de ódio é uma das saídas para estes problemas que já se mostrou eficaz.

Convido para a leitura do documento enviado às plataformas digitais no dia 8 de julho de 2022, com quatro eixos temáticos e sugestões precisas de medidas que precisam ser tomadas antes das eleições para que a gente proteja a democracia de fato. Este pedido/pressão/exigência já está na mesa das grandes empresas. O texto foi fruto de um trabalho colaborativo dos vários setores afetados e é assinado por mais de 90 organizações da sociedade civil, universidades e movimentos populares. Este é um assunto que interessa a todos nós e precisamos acompanhar de perto os resultados. Depois que passa, não adianta chorar o leite derramado. E que a gente se agarre ao segundo trecho da música Anjos Tronchos do Caetano Veloso.

Um post vil poderá matar
Que é que pode ser salvação?
Que nuvem, se nem espaço há
Nem tempo, nem sim nem não
Sim nem não
Mas há poemas como jamais
Ou como algum poeta sonhou
Nos tempos em que havia tempos atrás
E eu vou, por que não?
Eu vou, por que não? Eu vou

 

 

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Ana d´Angelo

Ana d´Angelo é jornalista, mestra em Comunicação e Semiótica pela PUC-SP, mãe do Zé e editora do *desinformante.

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