A Coalizão Direitos na Rede (CDR) reúne mais de 50 organizações da sociedade civil que trabalham em torno da pauta digital. Hoje (10/4) foi publicada uma carta aberta em defesa do Projeto de Lei 2630, de regulação das plataformas digitais, cujo debate foi retomado após os ataques de Elon Musk à Justiça brasileira. O texto corre o risco de ser enterrado, após declaração do presidente da Câmara, deputado Arthur Lira (PP-AL), de que ele não encontra consenso necessário para avançar e que será preciso começar do zero na construção de um projeto para regulação das redes.
A carta da CDR, além de expressar indignação diante da postura de Musk, expressa preocupação com a criação, na Câmara dos Deputados, de um Grupo de Trabalho para tratar do Projeto de Lei 2630. “Consideramos que o texto representa anos de debates e acordos possíveis entre diferentes setores. Somos uma coalizão dedicada à defesa dos direitos humanos e à promoção de um ambiente digital inclusivo e democrático, esperamos que o Brasil vote o PL e garanta mecanismos de transparência na operação das plataformas, fundamental para a defesa da democracia”, afirma o documento assinado pelo *desinformante e Aláfia Lab, Conectas, Avaaz, Coding Rights entre outras organizações.
O PL 2630 vem sendo debatido desde 2020, lembra a carta, tendo sido objeto de dezenas de audiências e centenas de contribuições de especialistas na matéria. “O amadurecimento brasileiro na discussão sobre regulação de plataformas precisa ser reconhecido para a aprovação de uma lei que esteja atenta às nossas especificidades e contribua para o respeito às instituições democráticas e a nossa soberania” .
A carta lembra que o projeto cria obrigações de transparência sobre as plataformas, amplia hipóteses de responsabilização desses agentes, fixa direitos dos usuários para garantir a liberdade de expressão, estabelece sanções e instituições reguladoras participativas para a fiscalização e aplicação de punições na esfera administrativa, em complemento ao necessário papel do Judiciário. “Infelizmente, a aprovação do PL tem sido bloqueada pelo intenso lobby das plataformas e pela resistência da extrema-direita, que usa a desculpa da liberdade de expressão para favorecer corporações e manter a liberdade de difundir conteúdos desinformativos e de ódio”, adverte.
A CDR ressalta os esforços do relator do projeto, deputado Orlando Silva (PCdoB-SP) na busca de um texto que dialogue com as diversas preocupações manifestadas pela sociedade civil. “O parlamentar tem demonstrado um engajamento significativo na construção de regras que garantam direitos na rede, desde o Marco Civil da Internet, com reconhecida dedicação em ouvir as diversas vozes da sociedade e encontrar medidas adequadas para regular o ambiente digital de forma equilibrada e justa”.
Eleições de 2024 exigem regras para garantia das democracias
Outro ponto abordado é o crescimento da extrema direita em diversos países facilitado pela lógica de funcionamento das plataformas, seja por não adotarem critérios para a proliferação de mensagens pagas, por construírem bolhas algorítmicas ou por não efetivarem uma moderação responsável de conteúdos online. “O caso de Musk não é diferente, uma vez que o dono da plataforma X tem sido denunciado há anos por ser apoiador de ideais conservadores e cooperar com regimes autocráticos ou autoritários, como ocorre em países como a Índia”.
Esse quadro se torna mais grave com as dezenas de eleições em todo o mundo, em 2024, que sofrem com os efeitos da plataformização desregulada sobre o debate público. “É preciso enfrentar um cenário em que as plataformas deixam de implementar medidas necessárias para proteger processos democráticos contra a desinformação, o discurso de ódio e outros problemas, ao passo que seguem lucrando com eles”.
A carta destaque hoje cinco grandes empresas controlam a circulação de conteúdos na Internet e, consequentemente, os espaços de debate e participação online. Estas empresas se comportariam de maneira diferente com o Norte e Sul Global no cumprimento das legislações regionais. “O desdém da plataforma X com o ordenamento jurídico brasileiro é mais um sinal da crise de equidade global associada às empresas de Big Tech e sedimenta a hipótese de que estas se importam apenas com os países do Norte Global. Esses mesmos países atuam, inclusive, de maneira mais incisiva por meio de regulações como o DSA e o DMA na Europa e por medidas de autoridades regulatórias como o Federal Trade Commission (FTC) dos Estados Unidos. O atendimento a ordens judiciais e observância às normas locais devem ser feitos em todos os países do mundo”.