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abr 25, 2024 | destaques, notícias

IVH documenta a realidade da violência contra jornalistas na Amazônia

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Nos últimos dez anos, 230 casos de violência contra jornalistas foram registrados nos nove estados da Amazônia, de acordo com o relatório da Federação Nacional dos Jornalistas (Fenaj). Mas esse número pode ser bem maior. A violência na região é o tema no relatório Fronteiras da Informação: Relatório sobre Jornalismo e violência na Amazônia produzido pelo Instituto Vladimir Herzog. A partir de entrevistas com comunicadores da região, o IVH  mostra as angústias e medos de quem reporta sobre a Amazônia e revela quais são os setores da economia que financiam a violência contra jornalistas e comunicadores.

“Para garantir uma sociedade segura, precisamos saber onde está sendo cometido um crime, como e onde agem os criminosos. Por isso, uma sociedade só é segura quando há segurança para os jornalistas”, escreve a jornalista da TV Globo Sônia Bridi no prefácio da publicação. Bridi revela que em 2022, após quase 40 anos de profissão, precisou trabalhar acompanhada de seguranças armados. 

“Para nós, que vivemos fora da Amazônia, o perigo seria relativo – caímos de paraquedas, reportamos, e vamos embora. Mas nossas fontes ficam. Nossos colegas, que vivem na Amazônia e têm suas famílias lá, ficam. Denunciam o garimpo, o político que invade terras, o grileiro que contrata matadores, e encontram essas pessoas na padaria, no supermercado”, reflete a jornalista ao também lembrar do assassinato do jornalista Dom Phillips e do indigenista Bruno Pereira.

O relatório do IVH, lançado nesta semana, aponta como apurações que envolvem o garimpo ilegal, a exploração madeireira, a expansão agrícola e até o narcotráfico na região amazônica motivam ameaças, agressões e mortes. A jornalista Emily Costa revela em entrevista que precisou sair de Roraima após ser ameaçada por publicar matérias sobre o garimpo ilegal em veículos nacionais e internacionais. Outra jornalista que não quis se identificar também precisou adotar medidas de segurança para fazer seu trabalho, assim como o repórter Felipe Medeiros.

“Fazer a cobertura desse assunto é delicado, pois grande parte da economia do Estado gira em torno do garimpo. A gente percebe que as pessoas à nossa volta, no dia a dia, são ligadas direta ou indiretamente a alguém que pratica essa atividade criminosa”, relatou Medeiros.

O jornalista da Globo Fábio Diniz também detalhou como sua vida mudou após uma reportagem investigativa – na qual ele nem aparecia – foi veiculada no Fantástico. O repórter precisou criar novas rotinas, ficar um tempo afastado da redação e chegou a ser recebido com tiros para o alto em uma cobertura em 2023. Diniz chegou a comunicar as ameaças sofridas dos garimpeiros à Polícia Federal, mas não sabe qual será o desfecho das denúncias.

Além de garimpeiros, madeireiros também ameaçam os comunicadores na região, como revela o relatório. “Em setembro de 2023, recebi ameaças por meio de conhecidos. Fui informado sobre pessoas que estavam circulando na região do assentamento mostrando a minha foto. Depois também recebi áudios em redes sociais. Isso aconteceu após uma denúncia que fizemos sobre a exploração madeireira ilegal na nossa comunidade”, disse Darlon Neres, comunicador do Pará.

Comunicadores indígenas também são frequentemente ameaçados, destaca o relatório do IVH. Em 2023, um grupo foi cercado por fazendeiros dentro da Terra Indígena Uru-Eu-Wau-Wau, em Rondônia, e mantido sob ameaças por quase cinco horas. “A gente foi cercado por mais de 50 homens, alguns estavam armados. A gente passou mais de cinco horas preso lá. E mesmo assim a gente tentou explicar para eles porque aquela área é terra indígena”, contou a líder indígena Txai Suruí.

Outros casos de violência são documentados no relatório, como a intimidação – pela própria Polícia Civil – dos jornalistas Bruno Abbud e Ednilson Aguiar ao investigarem uma das fazendas do ex-ministro Eliseu Padilha (PMDB-RS), a censura de reportagens que investigam grupos criminosos e os ataques à sede do jornal Rondônia Ao Vivo, que foi metralhada em novembro de 2022. 

O relatório também aborda o crescimento, nos últimos anos, das atividades criminosas que intimidam os jornalistas. Por exemplo, só em 2022 a área ocupada pelo garimpo ilegal no Brasil cresceu 35 mil hectares.

“Não é um relatório apenas sobre a violência que essas pessoas sofrem, mas também sobre como o sucateamento das políticas públicas de preservação do meio ambiente, levado a cabo pelo governo Bolsonaro, causou problemas sociais e econômicos gravíssimos, que exigem uma ação contundente e imediata do Estado brasileiro”, avalia Giuliano Galli, coordenador de Jornalismo e Liberdade de Expressão do IVH.

Recomendações

O Instituto Vladimir Herzog traz no relatório uma série de recomendações, tanto para os jornalistas, como para o próprio Estado brasileiro que, ao longo da publicação, vai se revelando omisso em diversos dos casos elencados. “O fato inegável é que, no vácuo do Estado, o crime organizado avançou, levando máquinas pesadas de garimpo que custam milhões e armando os garimpeiros com fuzis. Mas, principalmente, a ausência do Estado armou os criminosos com a ousadia que só existe com a certeza da impunidade”, escreveu Sônia Bridi na abertura.

Assim, o relatório sugere que o Estado aprimore as suas iniciativas de proteção a jornalistas e comunicadores com os seguintes pontos:

  • reforçar com estrutura e orçamento o Observatório da Violência contra Jornalistas e Comunicadores Sociais;
  • garantir as atividades do Grupo de Trabalho Técnico Sales Pimenta, responsável por propor políticas de segurança;
  • promover uma maior agilidade para atender as solicitações de proteção;
  • promover uma maior integração dos programas estaduais com o programa federal;
  • adotar um protocolo específico para direcionar os protegidos para o programa federal quando for constatada influência de agentes locais;
  • melhorar os canais de denúncia, através de ampla divulgação nacional;
  • estabelecer protocolos para forças de segurança a fim de queas denúncias de violência possam ser tratadas de forma específica;
  • promover campanhas de comunicação para toda a sociedade sobre a importância do trabalho jornalístico para o bom funcionamento do regime democrático;
  • garantir ampla participação social nos espaços de concepção e implementação de políticas públicas voltadas ao tema;
  • criar mecanismos para fortalecer – inclusive financeiramente – o jornalismo local, comunitário e independente, a fim de conter o avanço dos desertos de notícias.

Para os jornalistas, o IVH apresenta dicas de segurança e medidas para evitar novos casos de violência, como a adoção de um protocolo de segurança em toda viagem a campo e de um cronograma compartilhado junto ao veículo, o não compartilhamento de localização em redes sociais, portar aparelho de GPS e usar aparelho celular exclusivamente para atividades profissionais, diferente do aparelho pessoal.

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