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acervo pessoal

mar 21, 2022 | pontos de vista

Shadowban, a censura ´de leve´ que está codificando a conversa no Instagram

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Ser social media – ou qualquer usuário que tenha interesse em engajamento ou métricas – pode ser frustrante. A gente já sabe o quanto o algoritmo pode ser uma roleta russa e sabemos também das muitas variáveis que podem fazer o seu post bombar ou não. Quem nunca escolheu o melhor horário para postar ou então se preocupou com as palavras e emojis certos na legenda para gerar aquele engajamento? Mas imagine que você está fazendo tudo certo de acordo com o que mandam os gurus do marketing e, do nada,  ninguém mais curte ou vê suas publicações – pode ser que você tenha sofrido o que chamam de shadowban. 

Descobri que o shadowban existia por seguir alguns influenciadores que de repente passavam dias sem postar para se tornarem novamente “visíveis” no Instagram porque tinham feito algo que os colocavam nessa lista de banimento silencioso. Outro lugar em que comecei a me atentar para esse “fenômeno” foi nas páginas de fofoca – sem julgamentos, ok? – que começaram a escrever alguns termos com números ou asteriscos. Então agora não é mais Covid, é c0v1d. Morte virou m0rt3 e violência, v10l3nc1a. E você que lute pra entender uma legenda que fale sobre tudo isso.

Exemplo de legenda em página no instagram / Reprodução Instagram

Mas por que tudo isso?

Bom, o shadowban não é uma prática necessariamente explícita do Instagram e, ainda que essa não seja a única plataforma que pratique algo semelhante a isso, me concentro no insta por ser a mídia que eu mais tenho contato. Então, mesmo sabendo que o algoritmo é realmente uma caixa preta, esse banimento às sombras dificulta ainda mais o entendimento do que a rede social quer da gente – e dificulta o debate sobre quais são esses limites. 

Um dos poucos artigos acadêmicos que encontrei sobre a temática define o shadowban como “uma forma de censura leve e secreta que visa o que o Instagram define como conteúdo limítrofe”. Esse limite está entre o que é permitido e o que não é no Instagram, a partir do seu termo de uso, e se a plataforma entende que você publicou um conteúdo “vagamente inapropriado”. Dessa forma, você sofre algumas consequências, como queda de distribuição do conteúdo – o que acarreta na queda de engajamento – e ocultação de publicações nas páginas de explorar, por exemplo. A página e os conteúdos seguem no ar, só com menos visibilidade. A questão é que você não é nem avisado que sofreu alguma sanção, por isso o “shadow” do “ban”. 

 

E o que gera um shadowban?

Como eu disse, essa prática não é “pública”, ou seja, não tem como saber ao certo o que pode causar, mas muitos sites de marketing digital trazem as suas apostas das causas, com dicas para não cair nesse banimento obscuro:

  • Uso excessivo de #;
  • Uso de # proibidas, até o brasileiro #sextou está na lista (visto que em ingês é sex to you…);
  • Uso de apps para comprar seguidores;
  • Automação para curtidas e comentários;

 

Há quem aposte que o uso de alguns termos que falam de violência, morte ou outros também seja passível de atenção pelo Instagram. Além disso, também há indícios de que o nome de outros aplicativos é vigiado, por isso o TikTok se tornou “o app vizinho”.

A questão é que você não precisa necessariamente quebrar essas regras, basta o Instagram achar que você quebrou. Já vi alguns relatos de pessoas que comentaram muitos posts seguidos e foram bloqueadas temporariamente porque o comportamento era similar a um bot. 

Outro caso, que ganhou repercussão, foi o de várias dançarinas de pole dance que acusaram o shadowban em suas contas, além do bloqueio de hashtags que falavam sobre a prática.

Mas por que falar de shadowban em um site de desinformação?

Quando a gente fala de shadowban, muita coisa ainda é especulativa, quem acompanha constantemente esse universo, como sites de marketing e tecnologia (techtudo, rock content, postgrain), identificam essas práticas e até auxiliam os usuários a desviarem dessas sanções. 

Mas, como muita coisa é só percepção do próprio usuário, já vemos muitas práticas disseminando por aí, a principal – e a que me traz inquietação suficiente para escrever esse texto – é a codificação de palavras.

Lá no começo do texto eu comentei de páginas que colocam números nas palavras para não identificar aquele termo para o algoritmos. Em algumas páginas ‘vacina’ e ‘covid’ são sempre evitadas para que não venha junto o rótulo de informações do instagram – e possivelmente derrubem o engajamento. 

Alguns outros termos são constantemente modificados, principalmente os que podem ter teor violento ou sexual. Semana passada vi um veículo de comunicação também fazendo isso, mudando a palavra sexo por ‘s3xo’:

Às vezes eu espero que tenha sido um erro de digitação, mas a questão é que se esquivar de falar de assuntos importantes para não perder o engajamento é grave. E criar subterfúgios para isso acende um alerta. Moderação de conteúdo é extremamente importante e uma das medidas para combater a desinformação e discursos maliciosos. Gerar medo a partir de uma moderação obscura a ponto de um veículo de comunicação não usar a palavra sexo me parece bem grave. 

A gente sempre bate na tecla da transparência e aqui me parece ser necessário retornar a ela. Se as regras do jogo forem claras, não será melhor? Assim, não existirão tantas suposições do que pode ou não e temas não serão pré-censurados ou modificados para o debate. Em uma época em que engajamento é tudo, o medo de perdê-lo pode nos privar de informações sem c0d1g0s. 

 

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Liz Nóbrega

Jornalista do *desinformante e mestre em Estudos da Mídia pela Universidade Federal do Rio Grande do Norte (PPgEM/UFRN). Estuda desinformação, checagem de fatos e plataformas digitais.

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