Pesquisadores, jornalistas e representantes da sociedade civil organizada de mais de sete países do Sul Global se reúnem hoje e amanhã na PUC-Rio para o seminário “Desinformação e eleições na maioria (do Sul) global”. O evento tem como objetivo trocar melhores práticas e identificar oportunidades para iniciativas transnacionais de colaboração. A intenção é fortalecer iniciativas de países do Sul Global ao invés de replicar as ferramentas de países do Norte.
Na primeira mesa foi apresentada uma prévia do estudo “Lições aprendidas com o Brasil e as Filipinas – Coalizões Antidesinformação”, que avalia respostas legais, políticas e estratégias de organizações civis para combater a desinformação eleitoral.
O professor Jose Mari Lanuza, da Universidade de Massachusetts, um dos autores deste estudo comparativo, analisou que tanto Brasil como Filipinas têm um passado autocrático marcante e que permanece no imaginário de parte da população. Narrativas comuns nos dois países apontam que está enraizada a sensibilidade de um déficit democrático. Este ponto em comum se traduz numa nostalgia autoritária, distorção histórica. “Temos em comum com o Brasil uma saudade da ditadura”, afirmou.
Nas últimas eleições gerais, os filipinos foram às urnas, em maio de 2022, para votar no sucessor de Rodrigo Duterte, que liderou um governo conhecido pela luta antidrogas, políticas que resultaram em violações dos direitos humanos através de milhares de execuções extrajudiciais e a desinformação política como ferramenta contra os críticos e as forças progressistas.
Para Lanuza, o Brasil conseguiu avançar em várias frentes porque diversificou as medidas de combate à desinformação, simultaneamente, tais como checagem de fatos, ações políticas, jurídicas, lobby com plataformas, entre outras atividades. “No Brasil, Sleeping Giants focou no financiamento das campanhas desinformativas, pressionando empresas para tirar anúncios dos sites desinformativos. Isso não existe nas Filipinas”.
As campanhas desinformativas, segundo ele, precisam de coalizões que se complementem. “Ao invés de cada um fazer de uma forma isolada, fazer colaborações multissetorais”. Outro destaque para o pesquisador foi a atuação do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) no Brasil, um organismo que conseguiu fazer pressão legal junto a plataformas através das resoluções criadas durante a campanha eleitoral de 2022. Nas Filipinas, conforme explicou, os esforços não foram tão efetivos nesta área por não existir um órgão similar. O seu colega Jonathan Corpus Ong, também da Universidade de Massachusetts, um dos organizadores do seminário, reforçou que a diversidade de medidas é importante para avançar no debate. “Nenhum país entendeu tudo. Mais do que apoiar ferramentas universalistas, é preciso apoiar iniciativas que já existem nos países”, disse.
Coalizões da sociedade civil organizada brasileira foram destaque
As iniciativas brasileiras durante as eleições de 2022 para combate à desinformação eleitoral – mapeadas no relatório Desinformação e Eleições de 2022 no Brasil: lições aprendidas em um contexto Sul-Sul, de autoria dos pesquisadores Marcelo Alves, Rafael Grohmann, Raquel Recuero e Camilla Tavares – foram apresentadas durante o primeiro dia do seminário. Grohmann destacou a importância de fortalecimento do diálogo com outros países do Sul Global para que os países possam aprender uns com os outros.
O relatório aponta que o Brasil tem pesquisas robustas na área de desinformação, desenvolvidas especialmente nos últimos quatro anos. Além da academia, Grohmann destacou o papel central da Corte brasileira e das coalizões da sociedade civil em torno dos direitos digitais. O *desinformante é um dos veículos de comunicação inovadores citados pelo relatório por articular a produção de conteúdos de mídia com a organização de atores da sociedade civil para o combate à desinformação, através da SAD. “A partir de coalizões realizadas no país, ao final das eleições, a sociedade civil já estava mais preparada para discutir a regulação das plataformas e esta agenda já se imprime no primeiro ano do governo Lula”.
O relatório cita ainda a participação de influenciadores para colocar a desinformação no centro do debate no período eleitoral, como Felipe Neto e Casimiro, que teriam ajudado a “furar a bolha”.