Seis meses após a assinatura de acordos com o Tribunal Superior Eleitoral, as big techs ainda estão atrás no combate efetivo à desinformação. A conclusão é do estudo conduzido pelos pesquisadores Rodrigo Carreiro e Maria Paula Almada do Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia em Democracia Digital (INCT.DD), da Universidade Federal da Bahia (UFBA). A pesquisa, que ainda está em andamento e deve ser finalizada após as eleições, analisa o cumprimento ou não das medidas acertadas com o TSE por meio de uma análise comparativa.
Carreiro explica ao *desinformante que os memorandos de entendimento firmados estão divididos, em sua maioria, em três eixos: informar, capacitar e conter a desinformação. O primeiro eixo está conectado à promoção de informações seguras sobre o processo eleitoral, o segundo busca capacitar servidores para compreenderem o funcionamento das plataformas e o terceiro contém as ações mais combativas contra a desinformação. É neste último que as empresas de tecnologia estão “patinando”, de acordo com o pesquisador.
“A empresa Meta consegue avançar nesses dois eixos mais indiretos, mas no eixo principal ainda está atrás porque, embora eles tenham políticas específicas sobre eleições, integridade cívica, elas são muito genéricas em relação à eleição e, principalmente, as políticas não são direcionadas especificamente para o contexto brasileiro. Isso quer dizer que não respondem a questões específicas sobre a nossa realidade”, destaca Carreiro.
Outro ponto relevante é a falta de celeridade para conter determinados conteúdos, não há um prazo determinado para análise e ação contra uma desinformação, o que pode ter impacto no processo eleitoral.
O aplicativo Kwai, por exemplo, se comprometeu de forma específica a remover conteúdos maliciosos e contas falsas. No entanto, segundo a pesquisa, é possível encontrar vários vídeos com desinformação procurando por hashtags específicas. Além disso, um ponto elencado na pesquisa é o caráter multiplataforma que aparece de forma mais contundente nos vídeos curtos veiculados tanto no Kwai, como também no TikTok, ou seja, o conteúdo ultrapassa as barreiras do app específico e circula em vários outros canais, o que dificulta também o seu combate.
Além disso, os pesquisadores estão buscando traçar comparações com as ações aqui no Brasil em relação a outros países do mundo. O Google, por exemplo, não se comprometeu com medidas mais efetivas de remoção de desinformação, mas se comprometeu com a publicação de um relatório de transparência de anúncios políticos no país e a cumpriu. “Mas é um relatório de transparência que ainda está muito atrás de outros relatórios de transparência que foram publicados nos Estados Unidos, na Austrália e em outros países”, enfatiza Carreiro.
Uma das únicas plataformas que, segundo o levantamento, cumpriu tudo aquilo com que se comprometeu junto ao TSE foi o Twitter. “Mas no fim das contas, conteúdo danoso e desinformação continua circulando. Basta uma pesquisa rápida sobre ‘fraude nas urnas’ no Twitter e você vai encontrar conteúdo que promove esse tipo de desinformação. As plataformas tentam aplicar algumas sanções, derrubar canais, contas de forma pormenorizada, mas no fim das contas o grande paredão de fake news continua funcionando”, pontua o pesquisador.
O pesquisador avalia que o cenário já avançou em relação às eleições de 2018, mas que os acordos poderiam ter sido realizados anteriormente para ter algum tempo de avaliação e ajuste antes do período eleitoral. “As plataformas tentam cumprir algumas ações que não atingem diretamente o problema”, aponta Carreiro, que acrescenta que muitas mudanças só ocorrem de forma mais enérgica quando as plataformas são instadas por meio de legislações.
Documento cobra mais ações das plataformas digitais
Desde fevereiro, quando os acordos foram assinados, juristas já avaliavam a ineficácia das medidas prometidas pelas plataformas. “Certamente as medidas são bastante genéricas, elas devem ser mais específicas inclusive para poder mensurar o cumprimento do acordado e também o impacto e a eficácia delas”, apontou, à época, Estela Aranha, advogada e presidente da Comissão de Proteção de Dados da OAB-RJ.
Em junho, um grupo de entidades da sociedade civil lançou um documento indicando medidas para que as plataformas protejam a integridade eleitoral e assumam uma postura mais reativa contra a desinformação. Mais de 100 instituições já assinaram o documento que integra a campanha #DemocraciaPedeSocorro.