O Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios determinou, nesta sexta-feira (23), que o portal UOL retirasse do ar a reportagem investigativa sobre os 107 imóveis da família Bolsonaro adquiridos nos últimos 30 anos, dos quais 51 foram comprados com dinheiro vivo. Organizações veem com preocupação a decisão do desembargador Demetrius Gomes Cavalcanti.
“Esta é uma censura ao jornalismo investigativo e aos veículos de comunicação porque ela é uma decisão judicial que estabelece um limite à divulgação de informações”, afirmou Denise Dora, diretora executiva da Artigo 19.
Para Dora, esta é uma dupla violação do Artigo 19 da Declaração Universal dos Direitos Humanos, que defende que todos possuem o direito à liberdade de expressão e de receber e transmitir informações. “A decisão fere todos os standards internacionais, fere o direito constitucional da liberdade de expressão, que é uma cláusula de direitos fundamentais”, acrescentou Dora, que avalia a decisão como eminentemente política.
A Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo (Abraji) também indicou que a decisão viola a liberdade de imprensa. Em nota, a Abraji diz considerar absurda a determinação judicial: “Primeiro porque é de interesse de toda a sociedade brasileira ter conhecimento sobre transações suspeitas envolvendo familiares do presidente – entre eles, três parlamentares. Em um contexto eleitoral, a liminar é ainda mais grave, pois impede o escrutínio público, cerceia o debate e impede o exercício livre da imprensa”.
O Sindicato dos Jornalistas Profissionais do DF repudiou a determinação: “A censura imposta às matérias vai contra a liberdade de imprensa, que a própria Justiça deveria proteger, e ataca, mais uma vez, um dos mais importantes pilares da democracia”.
“É fundamental que se garanta constitucionalmente e politicamente espaço para a mídia independente operar, produzir informações”, defendeu Denise Dora. Para a diretora do Artigo 19, usar um lugar de poder, seja no executivo, legislativo ou judiciário, para atacar jornalistas individualmente ou atacar veículos de comunicação é grave. “É um discurso autoritário, de sociedades fechadas e não sociedades abertas. E é isso que a gente tem visto no Brasil”.
O Brasil foi um dos países com maior declínio no índice global de liberdade de expressão, acompanhando países como Afeganistão ou Hong Kong. Os dados do documento mostram que, de 2015 a 2021, o país caiu 58 posições no ranking global de liberdade de expressão, chegando a 50 pontos e à 89ª posição, seu pior registro desde o início da realização do levantamento, em 2010.
Um dos fatores, de acordo com Denise Dora, é o ataque ao jornalismo, o que é grave, principalmente em meio ao processo eleitoral. “Em ambiente eleitoral, em que o voto íntegro precisa estar baseado em informações livres e no debate público, reprimir esse debate, reprimir jornalistas é ainda mais severo”, concluiu.