A Corte de Justiça da União Europeia, nesta semana, deu ganho de causa ao órgão regulador de mercado da Alemanha numa ação que corre desde 2019 contra a Meta por abusos de privacidade e concorrência de mercado. A decisão já é considerada um marco importante na defesa de proteção de dados no bloco econômico e pode influenciar diretamente no modelo de negócios da plataforma.
A justiça europeia reconheceu que o Cartel Federal Office (CFO, em inglês) não infringiu suas normas ao impor sanções contra a empresa norte-americana, na época ainda chamada de Facebook, por descumprir o regulamento europeu de proteção de dados ao extrair informações sem consentimento dos usuários.
Em fevereiro de 2019, após cinco anos de investigação, o CFO alemão solicitou à corporação de Mark Zuckerberg que parasse de capturar informações dos usuários em páginas e aplicativos externos e cruzá-los para criação de “super perfis” com fins publicitários. O órgão identificou que a prática não só feria o regulamento de proteção à dados, mas também configurava um abuso de concorrência exploradora.
A Meta, então, recorreu à ação, argumentando que a coleta de dados seguia a lei e que o órgão estaria realizando abuso de poder, o que levou o caso ao Tribunal Europeu em 2021.
Na decisão proferida esta semana, o Tribunal não só reconheceu o poder do órgão de concorrência na proteção de dados dos usuários europeus, como também sinalizou que a única possibilidade de tratamento desses dados por parte da empresa é com o consentimento dado pelos usuários. Isso também significa que o usuário pode ter a opção de negar e continuar com acesso aos serviços da plataforma.
Mariana Rielli, advogada e pesquisadora do Data Privacy Brasil, comentou que a decisão da Corte é um marco, pois leva em consideração o próprio modelo de negócios da plataforma e dá continuidade a um debate sobre usos de dados por parte dessas empresas.
“A Meta tentou justificar que estaria adequada e que os requisitos estariam sendo cumpridos para que ela continuasse a usar seu método de publicidade na plataforma. Mas a Corte entendeu que não”, explicou.
O criador da organização “Europa contra o Facebook”, que monitora excessos da plataforma no território europeu, o austríaco Max Schrems comemorou a decisão do tribunal. “Isso significa que a Meta deve buscar o consentimento adequado e não pode usar sua posição dominante para forçar as pessoas a concordar com coisas que não desejam”, declarou.
Decisão cria precedente jurídico
Os impactos do posicionamento, segundo a pesquisadora Mariana Rielli, serão sentidos tanto em questões econômicas, pois afetam o modelo de negócios das empresas, como também jurídicas. “Com certeza a decisão da Corte tem um impacto, pois sempre gera um precedente para outros casos de sistemas semelhantes”, afirmou a pesquisadora.
O chefe do CFO, Andreas Mundt, também pontuou que o julgamento terá efeitos de longo alcance nos modelos de negócios da economia de dados. “Os dados são um fator decisivo para estabelecer o poder de mercado. O uso de dados pessoais de consumidores por grandes empresas de internet pode ser abusivo de acordo com a lei antitruste”, afirmou.
Já a jornalista Natasha Lopes, que cobre o setor de tecnologia na Europa, escreveu para o portal Techcrunch que “o dia 4 de julho poderá ser comemorado em breve como o dia da independência-do-capitalismo-de-vigilância-da-Meta”.
Ao Bloomberg, a Meta disse estar “avaliando” a decisão do tribunal da UE “e terá mais a dizer no devido tempo”.