O hype do metaverso ainda dava seus últimos suspiros e a imprensa observava com atenção as estratégias polêmicas de Elon Musk como novo dono do Twitter quando, no final de novembro de 2022, uma empresa de tecnologia, até então pouco conhecida lançava um novo serviço de chatbot inteligente: o ChatGPT. Em apenas cinco dias, a novidade já somava um milhão de usuários, ganhando atenção, primeiro da mídia especializada, até chegar ao grande público. Começava, assim, a explosão das Inteligências Artificiais generativas.
De lá para cá, não se passou nem um ano, mas muita coisa aconteceu. Outras bigtechs correram para lançar suas versões concorrentes (sem poupar esforços na casa dos bilhões de dólares), experimentando e desenvolvendo soluções para geração de conteúdo nos mais diversos formatos (texto, imagem, áudio e vídeo). Paralelamente, cada vez mais pessoas passaram a testar e a incorporar a tecnologia em seus cotidianos profissionais e, como era esperado, novas dinâmicas de desinformação apareceram nas plataformas digitais mundo afora.
Diante do novo cenário nos perguntamos, “IAí?”: o que está em jogo quando pensamos em Inteligência Artificial e desinformação? A partir de inquietudes compartilhadas em diversas reuniões do *desinformante, começamos a pensar os usos da IA no ecossistema da informação a partir de alguns pilares básicos. Entre as inúmeras dúvidas que pipocaram estavam: como a IA vai afetar o jornalismo? Como as redações vão absorver essa tecnologia? O que vai mudar na atividade jornalística e no modo de consumir notícias?
Sem termos condições imediatas para responder essas perguntas, também percebemos que não apenas no jornalismo isso estaria em jogo, mas no mercado de trabalho como um todo. Ao mesmo tempo em que a IA vem provocando ondas de demissões em diversos setores, também tem sido absorvida por inúmeras profissões, transformando muitas delas, eliminando algumas e criando novas. Acontecimentos que, em breve ou até mesmo ‘imediatamente’, passam a refletir nos processos educacionais e de formação escolar dos futuros profissionais.
Somando-se a isso, a viralização das deepfakes, com representantes políticos e governamentais em situações aparentemente hilárias, preocupam pesquisadores e estudiosos do campo da desinformação. Sobretudo quando percebemos que, no próximo ano, teremos mais de 65 eleições ao redor do mundo , que poderão contar com a presença massiva das IAs generativas, como as eleições presidenciais nos Estados Unidos e as municipais, aqui no Brasil.
Recentemente, tivemos um gostinho do que nos espera. Em abril, com a confirmação da campanha de Joe Biden para a reeleição, os republicanos desenvolveram um vídeo feito com ajuda de IA, projetando um suposto futuro caso o democrata fosse reeleito. Nos 30 segundos de duração do vídeo, imagens sintéticas mostravam situações de violência e desemprego com objetivos claros de causar pânico nos eleitores norte-americanos.
Para Ben Winters, consultor sênior do Electronic Privacy Information Center, o aumento dos conteúdos sintéticos e falsos pode diminuir ainda mais a confiança das pessoas nas informações disponíveis. “O trabalho dos jornalistas e de outras pessoas que tentam disseminar informações reais se tornará mais difícil”, avaliou Winters para o The Guardian.
Em um artigo no Financial Times, Marietje Schaake, diretora de política internacional do Centro de Política Cibernética da Universidade de Stanford, também alertou para os riscos trazidos pela dinâmica da desinformação reforçada pela IA. De acordo com Schaake, “embora grande parte do impacto da IA generativa nas eleições ainda esteja sendo estudado, o que se sabe não é tranquilizador. Sabemos que as pessoas têm dificuldade em distinguir entre meios de comunicação sintéticos e vozes autênticas, o que torna mais fácil enganá- las”.
Com tantas questões cruciais em jogo, “pedir ajuda aos universitários”, no sentido mais amplo do termo, é fundamental. Acompanhar e reunir pesquisas recentes sobre o tema se tornou mais uma tarefa do nosso dia a dia. Sentimos a necessidade de organizar e sistematizar todas essas questões, e as que virão, num espaço dedicado para IA e desinformação. E assim, nasceu a página especial “IAí?”, alocada no site do *desinformante.
Esperamos que a nova seção se consolide como um espaço de debate sobre os usos da inteligência artificial no ecossistema informacional, desvendando as vantagens de sua utilização, ao mesmo tempo em que aponta os riscos de determinadas aplicações. Vamos acompanhar os monitoramentos de práticas que podem ferir direitos fundamentais, apurando e analisando possíveis soluções para os problemas detectados.
Também desejamos estabelecer um diálogo constante com todos (as/es) que se interessem e se preocupem com o tema. Se você se identificou, por favor, não hesite em participar. Conte para nós o que as questões apontadas aqui te provocaram. O que você sentiu falta? O que gostaria de ver incorporado à página “IAí?”. Vamos juntos decifrar as implicações da IA em nossas vidas e no contexto da desinformação.