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jan 31, 2023 | destaques, notícias

Medida Provisória não é o melhor caminho para regulação das redes, defendem especialistas

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A Coalizão dos Diretos na Rede (CDR) lançou, na sexta-feira (27), uma carta aberta apresentando preocupações em relação ao “Pacote da Democracia”, formulado pelo Ministério da Justiça e entregue ao presidente Lula na semana passada, que traria uma proposta de medida provisória para responsabilizar as plataformas digitais. As informações sobre o pacote são do Ministério da Justiça e do Jornal Folha de S.Paulo, já que até o momento o texto das medidas apresentadas não se tornou público.

Na carta, a coalizão afirma que apesar do texto da medida provisória não ter sido publicizado, “as declarações do ministro Flávio Dino sobre a matéria ensejam alertas”. Para a coalizão, o primeiro desses alertas é que essa temática requer uma discussão com a participação de diferentes setores atingidos e interessados na regulação. O segundo dos pontos elencados trata da necessidade de “equilibrar a imposição de novas responsabilidades às plataformas digitais com a garantia da proteção de direitos humanos, como ocorreu na discussão do Marco Civil da Internet”.

A Coalizão Direitos na Rede é uma rede de entidades que reúne mais de 50 organizações acadêmicas e da sociedade civil em defesa dos direitos digitais, tendo como temas principais de atuação: acesso, liberdade de expressão, proteção de dados pessoais e privacidade na Internet.

O documento reafirma a importância de se avançar numa proposta de regulamentação, porém pontua que ele deve partir do acúmulo realizado pela discussão do PL 2630 (apelidado de PL das FakeNews) e também com uma ampla articulação junto à sociedade civil.

“Acho que é importante esclarecer que o debate sobre regulação de plataformas de redes sociais no Brasil não começa a partir de 08 de janeiro. Essa é uma discussão que a sociedade civil que atua no debate de direitos digitais e direito à comunicação vem realizando há vários anos”, lembra Renata Mielli, coordenadora do Centro de Estudos da Mídia Alternativa Barão de Itararé, organização que integra a CDR. “Por isso, é um erro o governo tentar enfrentar um tema de alta complexidade, que já vem sendo discutido há anos, através de uma Medida Provisória. Por mais que se argumente que a MP não vai regular plataformas, na prática ela vai estabelecer um recorte para impor uma regulação”, prossegue.

Preocupação semelhante é compartilhada por Bia Barbosa, do DiraCom, que também integra a coalizão. “Nós entendemos que, sim, nós vivemos uma situação emergencial de enfrentamento às tentativas de violações do Estado Democrático de Direito, de desestabilização da democracia. Entretanto, um projeto de regulação do setor, que certamente vai impactar em como o fluxo de informação circula nas redes sociais e no modelo de responsabilidade dos intermediários em relação a conteúdos, não é algo que a gente entenda que deva ser tratado via medida provisória”.

Ambas as especialistas da coalizão apontam que mesmo tendo um escopo claro, focado nos discursos e ações contra o Estado Democrático de Direito, é um equívoco acreditar que a MP não trará consequências maiores para a discussão regulatória geral e para o exercício da liberdade de expressão, reforçando o equívoco de se tratar o tema por medida provisória. Bia Barbosa, inclusive, lembra que caso o texto da MP (que não é conhecido) impacte em direitos e liberdades, ele pode ser considerado inconstitucional, pois é prerrogativa de Projetos de Lei que devem ser discutidos no Congresso Nacional.

Amplo debate e cuidados a serem tomados

“O primeiro cuidado no debate de qualquer regulação, a meu ver, é a garantia de um processo de ampla participação e escuta da sociedade: terceiro setor, academia, setor empresarial e inclusive agentes públicos variados”, pondera Renata Mielli. Para a especialista, é necessário ter cautela na discussão sobre regulação de plataformas, uma delas é não dar mais poder para empresas que já são poderosas demais.

“Quando discute-se que é necessário responsabilizar as Big Techs, ou gerar deveres de cuidado sobre a circulação de determinados conteúdos, com monitoramento específico e adoção de medidas de redução de alcance, remoção, etc, a regulação poderá gerar efeitos negativos ao conferir a empresas privadas o papel de decidir o que circula ou não de conteúdo de forma ainda mais discricionária”, explica Mielli.

Bia Barbosa acrescenta que quando se pretende adotar novas regras de funcionamento dos provedores tanto de aplicação quanto de conexão que impactam no funcionamento no território de um país, “é fundamental que sejam feitas análises de impacto regulatório antes dessas medidas serem implementadas para entender se aquele alvo que se busca alcançar de fato será alcançado”. Ela lembra de muitos exemplos de legislações que buscaram tentar responder a determinado desafio mas que, ao serem implementadas, na prática, acabam tendo efeitos colaterais mais negativos do que positivos.

Outro cuidado é não cair na tentação de transpor de forma automática soluções regulatórias encontradas em outros países, com contextos jurídicos, sociais, culturais e econômicos diferentes dos nossos. “O que pode ser adequado para a Alemanha, por exemplo, pode não ser adequado para o Brasil”, conclui Renata Mielli.

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