“As plataformas digitais são ainda muito complacentes com crimes de racismo. Muitas vezes dificultam a entrega de dados. Isso tem avançado positivamente nos últimos anos, mas ainda requer críticas”, afirma Yuri Santos Jesus da Silva, pesquisador de políticas públicas de Direitos Humanos e Igualdade Racial. “Não pode existir qualquer cumplicidade no sentido de demorar a entregar dados para facilitar o enquadramento penal no crime de racismo”, completa o pesquisador, que integra também o Grupo de Técnico de Igualdade Racial da Transição de Governo, em trabalho até a posse do presidente eleito Luís Inácio Lula da Silva.
O GT de Igualdade Racial da Transição de Governo publicou nota ontem, Dia da Consciência Negra, na qual diz que “não basta apenas recuperar a nossa democracia tão atacada pelas forças reacionárias que subverteram a ordem e tentaram transformar o país em um espaço de ódio e intolerância”. Precisamos recuperar a nossa democracia de forma mais qualificada, por isso, ela precisa ter como base a igualdade social, racial e de gênero, com justiça social e retorno da dignidade da população brasileira”.
As denúncias de crime de racismo nas redes sociais vêm aumentando ano a ano, conforme levantamento realizado pela Safernet. Entre 2017 e 2018, o aumento foi de 35%; entre 2019 a 2020, mais de 147% e, nos últimos dois anos, entre 2021 até outubro de 2022, as denúncias de crime de racismo subiram 14,3%. Só entre janeiro e outubro deste ano, em números absolutos, foram 6.586 denúncias recebidas pelo Centro Nacional de Denúncias de Violações contra Direitos Humanos.
“O crime de racismo requer o flagrante, sobretudo, contra pessoas que se escondem atrás dos aparelhos eletrônicos. Já é tão difícil tipificar um crime como racismo, em vez de injúria racial, então contribuir com a celeridade na investigação é função também dessas plataformas” exemplifica Yuri da Silva.
O documento do GT de Igualdade Racial reforça a importância de implementar e materializar a Convenção Interamericana contra o Racismo, a Discriminação e Formas Correlatas de Intolerância, a Convenção 111 da OIT, a Constituição Federal e o Estatuto da Igualdade Racial. Alerta, ainda, para a urgência de combate ao ódio racial.
O combate ao racismo estrutural
As denúncias de crime de racismo nas redes refletem a realidade brasileira na qual o racismo permanece como um grande estigma social. “A superação do racismo estrutural passa por uma crescente educação do povo e da sociedade, coisa que o movimento negro brasileiro vem fazendo há mais de 40 anos, com seu caráter educador. Mas, prioritariamente, é preciso apontar políticas públicas que garantam direitos para o povo negro, direitos historicamente negados”, lembra Yuri da Silva, lembrando que a política de igualdade racial não é setorial, pois ela trata de 56% da população do país. “Precisa ser uma política central, transversal, intersetorial. Precisa atingir as outras áreas, como educação, saúde, justiça, segurança pública, desenvolvimento regional, social e outras pastas”.