Enquanto o Brasil se prepara para receber o primeiro encontro ministerial do G20 nesta semana, a pauta digital avança em outros grupos de engajamento. Nesta terça-feira (20), representantes do governo federal, pesquisadores e integrantes de think tanks internacionais se reuniram em Brasília para debater os principais pontos que guiarão a agenda digital do evento deste ano. A reunião, realizada pela força-tarefa de transformação digital inclusiva do T20 (Think Tanks 20), marcou o início dos diálogos multissetoriais sobre temas como integridade da informação, Inteligência Artificial e acesso justo à Internet.
Em mais de sete horas de programação, os participantes levantaram questões que estão presentes nas oito sub-trilhas da força tarefa do T20, mas que também perpassam outros grupos como o próprio G20 e o C20. “Tivemos uma troca muito produtiva com os representantes governamentais que estão fazendo parte do Grupo de Economia Digital, cada um veio e falou especificamente do seu tema de trabalho”, avaliou Jaqueline Trevisan, coordenadora do Data Privacy Brasil e vice-líder da força tarefa de transformação digital inclusiva do T20.
O tópico da integridade da informação foi apresentado por João Brant, secretário de Políticas Digitais da Secretaria de Comunicação Social (SECOM) e que também integra o Grupo de Trabalho de Economia Digital do G20. Na ocasião, Brant reforçou o uso do termo pelo governo brasileiro com base em documentos da Organização das Nações Unidas (ONU) para dar conta de discussões que envolvem desinformação, discurso de ódio e violência política no ambiente digital.
Para Guilherme Canela, chefe da Área de Liberdade de Expressão e Segurança de Jornalistas da Unesco, a introdução dessa discussão pode esclarecer como o assunto está sendo tratado pelos países membros do grupo dos 20. “É importante a gente trazer essa discussão a ambientes como G20, pois precisamos entender melhor quais são as posições dos países sobre esse tema”, afirmou Canela. Logo em seguida, Brant afirmou que o termo foi previamente bem recebido pela maioria dos países membros.
Ainda sobre o tema da integridade da informação, Maria Paz Canales, pesquisadora da organização britânica GlobalPartnersD, lembrou da necessidade de refletir sobre o atual modelo de negócios das plataformas, que colocam em prioridade o lucro ao invés da proteção aos direitos humanos. “Muito mais pode ser feito para que as plataformas sejam responsáveis”, concluiu a ativista, pedindo também para que o acesso a dados a pesquisadores e sociedade civil por parte das empresas de tecnologia seja considerado nas discussões do grupo.
O tópico da Inteligência Artificial também foi debatido pelos integrantes presentes no evento. Stephanie Ifayemi, chefe de políticas da Partnership of AI, celebrou a adesão do tema pelo T20, afirmando que é necessário aplicar as vozes da sociedade civil nessa discussão. Já Adeboye Adegoke, gerente da organização africana Paradigm Initiative, pontuou a importância da transparência por parte das empresas de IA para evitar os riscos relacionados a vieses presentes no desenvolvimento dessas tecnologias. A necessidade de desenvolver a infraestrutura e a segurança de dados nos países menos desenvolvidos também foi pontuado no debate.
Sul Global no centro das discussões
A importância de pautar o debate de governança digital internacional a partir do Sul Global, termo utilizado para designar o que antes era chamado de “países em desenvolvimento” ou “terceiro mundo”, foi reforçada ao longo de todo o evento. Essa perspectiva já vem sendo colocada em destaque pelo próprio governo federal, que busca consolidar as discussões sobre os principais temas atuais pelas lentes da equidade e da justiça social vindas desses países.
“É uma oportunidade muito especial para o Sul Global montar uma agenda para os países do G20”, comentou Jaqueline Trevisan. “A criação de uma agenda que trabalhe com desenvolvimento, com inclusão e redução de assimetrias de poder é muito importante”.
A adesão dessa perspectiva também pode ser vista na própria força-tarefa de inclusão digital do T20, na qual a lista dos 21 integrantes tem forte presença de representantes fora do eixo Europa e Estados Unidos, sendo 8 deles do Brasil. Cada uma das sub-trilhas também é coordenada por alguém do Sul Global.
Próximos passos
Além de realização de eventos de discussão, o T20 também tem a função de receber sugestões de políticas públicas – chamadas de policy briefs – para a elaboração de uma declaração a ser enviada ao G20. Neste ano, a força-tarefa de transformação digital inclusiva foi uma das que mais recebeu propostas, sendo 175 ao total. De acordo com Jaqueline, o grupo está atualmente finalizando a seleção dos resumos submetidos.
A expectativa, ainda de acordo com a coordenadora do Data Privacy, é que os trabalhos selecionados sejam compartilhados publicamente em junho, quando começam os esforços de sumarização e de finalização do documento que será enviado pelo T20 à Trilha de Sherpas do G20.
O T20 é um dos diversos grupos de engajamento paralelos ao G20 que reúne representantes de diferentes setores, como centros de pesquisa e organizações da sociedade civil, para debater e refletir sobre pontos importantes para o bloco dos países envolvidos. O T20 no Brasil é coordenado pelo Centro Brasileiro de Relações Internacionais (CEBRI), Fundação Alexandre de Gusmão (FUNAG) e pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA).
O grupo é dividido em 6 diferentes forças-tarefas que tratam de assuntos como o combate à desigualdade social e econômica, mudanças climáticas e governança global. A força-tarefa 5, que trata sobre Transformação Digital Inclusiva, tem o objetivo de impulsionar as inovações digitais para promover os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) da Agenda 2030, garantindo ao mesmo tempo a inclusão e considerações éticas.