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@thiagoilustrado

dez 13, 2023 | Destaques, Notícias

Regulação das plataformas: quem, o que e como? CGI recebeu 1.336 contribuições em consulta pública

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O Comitê Gestor da Internet divulgou hoje (13) o resultado da consulta pública sobre regulação de plataformas digitais no Brasil. No total, a organização multissetorial recebeu 1.336 contribuições de 140 pessoas físicas e organizações dos quatro setores que a compõem: setor governamental, terceiro setor, setor empresarial e comunidade científica e tecnológica.

A consulta foi dividida em três eixos com 43 perguntas que buscaram mapear os riscos oferecidos pelas atividades das plataformas, as medidas regulatórias que podem mitigá-los e as formas e os atores necessários para que a regulação seja implementada. A sistematização das contribuições se propõe a destacar as diferentes perspectivas existentes entre os setores e elencar os consensos e dissensos sobre os diversos temas tratados.

“A sistematização de nossa consulta aponta que seria importante subsidiar um processo de regulação que estimule acordos multissetoriais, e não somente soluções exclusivamente regulatórias”, pontua Henrique Faulhaber, coordenador do Grupo de Trabalho sobre Regulação de Plataformas do CGI.br.

“A ideia é promover uma série de discussões da sociedade, a gente quer que esse documento seja apropriado pelo conjunto de atores, não só que contribuíram diretamente na consulta, mas pelo setor governamental, empresarial, pela academia, sociedade civil, pelo parlamento que está discutindo esse tema para que possam beber dos resultados dessa consulta e considerar isso no avanço do debate sobre regulação de plataformas no Brasil”, disse Bia Barbosa, integrante do Grupo de Trabalho Plataformas Digitais do CGI, em coletiva realizada nesta quarta-feira.

Quem deve regular?

O primeiro eixo da consulta pública se debruçou sobre a conceituação de plataformas digitais e quais deveriam ou não serem incluídas em uma regulação. Para isso, foram abordadas questões sobre os elementos que constituem as plataformas, como a infraestrutura tecnológica, os atores e suas relações e as características delas. A questão recebeu 225 contribuições que abordaram também delimitações para possíveis regulações setoriais.

Além de diferenças regulatórias a partir do serviço prestado, um outro aspecto presente no primeiro eixo e que conquistou um forte consenso entre as contribuições foi a necessidade de uma regulação assimétrica, ou seja, criar regras específicas para determinados atores a partir de critérios próprios, como o número de usuários das plataformas.

O que deve ser regulado?

O segundo eixo da consulta foi o que mais recebeu contribuições, foram 976, o que corresponde a 73% do total. Esse ponto abarca questões cruciais sobre os riscos decorrentes das atividades das plataformas digitais e suas possíveis medidas de mitigação. “As perguntas da consulta partem da ideia de que há riscos já constatados na forma de funcionamento das plataformas e no seu modelo de negócios para a disseminação de desinformação de uma maneira organizada e intencional. Não estamos perguntando se há riscos ou não, mas sim quais são e como eles devem ser mitigados”, explica Bia Barbosa. 

Dentro dos riscos, o CGI buscou contribuições para entender as ameaças à concorrência, ao direito do consumidor, ao abuso de poder econômico e à concentração econômica e de dados; à soberania digital, ao desenvolvimento tecnológico e à inovação; ao trabalho decente; e à democracia e aos Direitos Humanos. 

Esses tópicos apresentaram grandes divergências entre os setores, principalmente no tópico do direito concorrencial. O setor privado, que abrange os representantes das plataformas digitais, defendeu que o mercado de tecnologia é marcado por intensa inovação e destacou os benefícios trazidos para a economia, argumentando que o Brasil já possui um sistema robusto para tratar dessa temática. Já o terceiro setor, a academia e o setor governamental apontaram estratégias anticompetitivas das plataformas que contribuem para a formação consolidada de poder de monopólio e de seu abuso. 

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No âmbito da democracia e dos direitos humanos, foram elencados os prejuízos para a liberdade de expressão e pontuados três aspectos das plataformas digitais que contribuem para a deterioração do ambiente informacional: a coleta e tratamento massivo de dados pessoais; o perfilamento e micro segmentação de conteúdos; e os sistemas algorítmicos das plataformas programados para aumentar o tempo de engajamento, muitas vezes permitindo a monetização de conteúdos desinformativos.

Entre as estratégias de mitigação desse cenário foram elencadas algumas saídas, como o fortalecimento do jornalismo. Para o terceiro setor e a comunidade científica e tecnológica, esse movimento passa pela transferência das receitas publicitárias às plataformas digitais, a chamada remuneração do conteúdo jornalístico. Já para o setor privado, no entanto, “a crise no jornalismo não é consequência das atividades das plataformas, podendo inclusive ser uma relação benéfica, com aumento de sua pluralidade”. 

A divergência sobre estratégias de mitigação também se encontra no tópico da transparência. Parte das contribuições defende a necessidade de obrigações para caminhos mais transparentes, já outro setor defende que o modelo atual é suficiente e que a obrigação de transparência poderia se chocar com a “proteção de segredos comerciais” e afetar informações sensíveis sobre os modelos de negócios. 

Além disso, também foram abarcadas na consulta questões sobre o modelo de responsabilidade das plataformas. As contribuições abarcam quatro alternativas: a manutenção dos termos atuais do Marco Civil da Internet; o estabelecimento de um regime de responsabilidade objetiva e solidária para plataformas digitais por conteúdos de terceiros impulsionados e monetizados; a criação de um regime de responsabilidade especial  baseado na obrigação de moderar categorias de conteúdos específicas; e o estabelecimento de obrigações de avaliação e mitigação dos riscos sistêmicos relacionados à moderação de conteúdos. 

Como deve ser feita a regulação ?

O último eixo da consulta pública aborda questões sobre quem seria responsável por implementar e fiscalizar a regulação, ou seja, quem atuaria como órgão regulador. “Esse talvez tenha sido o eixo que apresentou o maior conjunto de incertezas e dissensos. Nós vivemos uma realidade bastante peculiar no Brasil que é a ausência de um órgão que a sociedade e o Estado olhem e vejam que já existe uma estrutura capaz de implementar todas as camadas de regulação que são exigidas. Diante dessa ausência, há uma série de ponderações e posições dos diversos segmentos de como enfrentar essa situação. Nossa consulta mostra que há um conjunto diversificado de possibilidades para um desenho institucional”, coloca a coordenadora do CGI, Renata Mielli.

O multissetorialismo, a independência e a transparência foram consensos entre as contribuições como características que devem compor essa entidade. No entanto, as propostas trouxeram três possíveis caminhos: criação de uma autoridade para regulamentação; criação de um sistema de governança; e a criação de uma entidade de autorregulação, além de uma entidade autônoma de supervisão.

Consensos e divergências

Para Mielli, coordenadora do CGI, o relatório é uma forma de o público conhecer, de forma sistematizada, as perspectivas e os posicionamentos do setor privado, do terceiro setor, da comunidade científica e tecnológica e do setor governamental. Apesar de alguns consensos, a consulta mostra divergências na forma como os setores entendem determinados pontos. No entanto, de acordo com Renata Mielli, não são totalmente inconciliáveis.

“Eu acredito na possibilidade da construção de pontes entre as visões diferentes. Mas, de fato, tem alguns pontos que são bastante difíceis de a gente encontrar uma média ponderada, entre elas está o grau de transparência e obrigações que a gente quer impor a essas plataformas”, comenta Mielli. Para ela, por existirem interesses econômicos envolvidos e ser um tema que polariza, a convergência se torna mais difícil.

Para os diretores do Comitê Gestor da Internet, o debate sobre regulação de plataformas seguirá na agenda por muito tempo porque, por mais que o PL 2630/2020 – ainda que não tenha sido aprovado – esteja mais avançado no debate, ele não abarca muitas outras questões que precisarão ser debatidas no Congresso, como o trabalho por plataformas, regulação econômica e outros. Além disso, argumentam, o tema invariavelmente se chocará com questões de regulação de Inteligência Artificial, por exemplo.

“É uma agenda que a gente vai enfrentar por muito tempo ainda, e a consulta do CGI ajuda a provocar esse debate de uma maneira multissetorial na sociedade pode trazer subsídios muito relevantes para os atores que podem definir essa estratégia”, coloca Bia Barbosa.

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