Oito meses após o lançamento do documento “O papel das plataformas digitais na proteção da integridade eleitoral de 2022”, mais de 100 organizações da sociedade civil organizada brasileira divulgam o segundo balanço da iniciativa. Com o objetivo de recomendar e reivindicar ações para a segurança do processo eleitoral e do debate digital, as organizações apontam agora para a falta de comprometimento das empresas de tecnologia com o combate à violência política de gênero e raça e o negacionismo climático e socioambiental.
A análise apresentada nesta terça-feira (7) abrange as plataformas Facebook, Instagram, Kwai, Telegram, TikTok e WhatsApp. De um modo geral, o documento aponta que nenhuma das empresas se comprometeu publicamente a alterar o ritmo da moderação de conteúdo para monitorar os casos de violência política direcionadas às candidatas(os) pertencentes a grupos historicamente marginalizados. Além disso, não há ou são raras as regras dedicadas a frear a propagação de posts contendo negacionismo do clima.
O balanço apresentado traz uma análise específica de cada plataforma, pontuando as ações já realizadas e os pontos críticos que merecem atenção e reivindicação. As plataformas da Meta, por exemplo, avançam ao terem setores internos voltados ao tema da violência política de gênero. No ano passado, por exemplo, a empresa publicou guia sobre violência de gênero contra mulheres na política. O tema ambiental também é lembrado. Em 2021, o Facebook disponibilizou uma central de informações sobre o clima no Brasil, com fatos sobre mudanças climáticas e seção que elenca mitos sobre questões ambientais.
Entre as preocupações, os signatários do documento apontam que Facebook e Instagram não publicizam seus critérios de seleção de denúncias de casos de violência política, não fortalecem a moderação ou a remoção de posts nesses casos e não abrangem atores políticos e sociais oprimidos, como candidatos/as e políticos/as quilombolas, indígenas e LGBQTIA+.
No campo ambiental, o grupo reforça que a Meta não incluiu, na sua política de desinformação, a categoria de negacionismo climático, além de não identificar com rótulos postagens negacionistas sobre o tema e outros consensos científicos sobre questões socioambientais do Brasil. “Não há política que vede publicidade digital com negacionismo do clima e socioambiental, a exemplo do que ocorre com anúncios que desencorajam a vacinação”, revela o documento.
Já o Twitter não tem política específica para casos de violência política, tampouco com foco em gênero e raça. Também não há, de acordo com o documento, política específica para casos de negacionismo sobre mudanças climáticas e questões ambientais, assim como inexiste política que coíba o impulsionamento desses posts.
O YouTube também não aborda a violência política e a violência política de gênero e raça em suas políticas de desinformação eleitoral, conteúdo violento ou explícito e discurso de ódio. No âmbito socioambiental, a plataforma possui uma regra que veda a monetização de canais e vídeos que propagam negacionismo climático, no entanto, esses conteúdos seguem presentes na plataforma e continuam obtendo monetização, de acordo com monitoramento feito por pesquisadores e jornalistas.
O TikTok segue as outras plataformas ao não mencionar violência política nas suas regras sobre comportamento de ódio, apesar de essas serem mais detalhadas que as observadas em outras redes, justamente por incluir a proibição de ataques e insultos a vários grupos protegidos. Já o negacionismo climático não está abordado no rol de informações enganosas prejudiciais e o impulsionamento desse tipo de conteúdo não é vedado pelo aplicativo.
As organizações também analisaram a atuação do Kwai. O aplicativo de vídeos curtos também não menciona violência política e a violência política de gênero e raça nas suas diretrizes, assim como não possui uma política ou regras focadas em combater o negacionismo do clima.
Os aplicativos de mensageria WhatsApp e Telegram foram contemplados no documento. O Telegram não possui políticas sobre os temas analisados e o WhatsApp foi considerado com “baixa ou nenhuma capacidade de aplicar a própria política de não permitir o uso do aplicativo para circulação de informações enganosas e falsas”
Organizações deixam sugestões de medidas a serem adotadas
Além do diagnóstico, o grupo de mais de 100 organizações da sociedade civil também apontou 22 sugestões para as plataformas nos dois campos. As instituições reforçam a necessidade de nomear a violência política como fenômeno social e inserir o tema nas políticas das plataformas, assim como estratégias para mitigar o fenômeno. A realização de campanhas publicitárias e capacitação de candidatos também foram elencadas como necessidades.
O negacionismo do clima e a agenda socioambiental também devem ser tratadas como preocupação de interesse público, de acordo com o documento. Para as organizações, conselhos voltados a essas agendas devem ser criados dentro das empresas e protocolos de combate ao discurso de ódio direcionado aos povos originários devem ser estabelecidos.
Outro ponto destacado no documento é a necessidade de proibição de anúncios com conteúdos que negam as mudanças climáticas, barrando a monetização desses canais de forma efetiva.
Primeiro balanço mostrou que plataformas permitem conteúdo golpista
O documento também reforça demandas realizadas em campanhas anteriores. O primeiro balanço divulgado pelas organizações, em setembro de 2022, abordou políticas referentes à integridade eleitoral e à biblioteca de anúncios. “O documento concluiu que nenhuma plataforma desenvolveu políticas adequadas e abrangentes para impedir chamados à sublevação contra a ordem democrática ou contra a transferência pacífica de poder que não apelem explicitamente à violência. Essa questão tornou-se ainda mais evidente e central depois das tentativas golpistas de 8 de janeiro de 2023”, indica o relatório mais recente.