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acervo pessoal

ago 8, 2022 | pontos de vista

Uma ‘checagem de fatos’ exclusiva para o Dia dos Pais

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“Amor, li umas coisas muito bacanas sobre a pedagogia Waldorf. Vamos conversar sobre essa possibilidade de escola para Inácio?”. “Meu bem, marquei pediatra de Luizinho para a próxima sexta. Você consegue dar uma escapadinha e ir conosco?”.

Feche os olhos e…melhor, abra-os, arregale-os, esbugalhe-os e me conta aqui: foi um pai ou uma mãe que disse essas frases?

Se mesmo depois de ter caçado confusão no Ponto de Vista sobre o Dia da Mães continuei seguindo minha vidinha digital protegida pelo manto adamascado de Nossa Senhora do Cancelamento, me atrevi agora a apagar as velas e soltar as mãos de Nosso Senhor da Passação de Pano pois se aproxima o Dia dos Pais.

E se você está aí pensando que falo de um lugar de observação do meu entorno e até mesmo partindo de uma experiência, por vezes frustrante, de divisão de tarefas, você acertou. Mas se pensa que falo de um lugar de exceção, enganou-se como enganam-se muitos homens quando perguntados sobre o nome do melhor amigo do filho ou sobre o personagem favorito do desenho. Mas, justiça seja feita, muitos deles costumam ter na ponta da língua o valor da mensalidade da escola.

Se pensando sobre o assunto da divisão das responsabilidades entre mães e pais você perceber que nem precisa ir muito longe para se indignar com a sua sobrecarga (física e mental) e se, conseguindo chegar a essa conclusão, você se perguntar: amargurei ou amadureci? Te digo: as duas coisas, minha amiga. Neste caso, a indignação costuma vir abraçadinha com a consciência e gestos direcionados a algum tipo de mudança.

Para você que está me lendo e que está sentindo muita vontade de se posicionar nos comentários em defesa do pai de sua cria, pode ir lá. Mas, antes, faz aí um exercício: esse pai está mesmo desempenhando a função paterna? Ele está dividindo responsabilidades ou ele está te ajudando? Me conta aqui, ele tem sido pai e parceiro no rolê ou ele tem sido apenas um tio legal pra caramba para o filho dele? Meu irmão é um tiozão e me ajuda ficando com meu filho para eu sair a noite, me ajuda brincando e conversando com ele, mas não precisa se responsabilizar por pesquisar se a Meningocócica ACWY já chegou no SUS.

A forma como os homens são levados a exercerem suas paternidades e se acomodam num lugar quase que totalmente desprovido de autocrítica é um poço de desinformação, uma imensidão de não saber sobre si próprio e sobre sua descendência.

Eu já disse e provavelmente você também já tenha dito o clássico: “ele que perde sendo pouco presente na vida do filho.”

Minhas queridas e meus queridos, isso é notícia falsa, simples assim, isso não é verdade. É claro que pais perdem quando compram ingresso para se sentarem na Plateia III do crescimento de um ser humano, mas a gente perde também e perde muito.

Eu já vi várias pesquisas sobre o quão mais impactante é ter um filho para a vida profissional das mulheres. E, boa parte das vezes, basta ser mãe para nem querer ler pesquisas pois a gente consegue recitar dados sobre essa situação já que fazemos parte da estatística.

Mulheres não conseguindo promoções porque anunciam gravidez e não estarão compromissadas com o trabalho – como o sistema exige que elas estejam – e homens anunciando gravidez de suas companheiras e sendo promovidos pois precisarão de dinheiro para manutenção da família que cresce. E você ainda repetindo que “eles que perdem”.

E não é só a vida profissional que sofre o impacto: mães têm menos tempo para a prática de exercício físico, encontram-se menos com amigos, recebem mais multas de trânsito saindo correndo do trampo para buscarem filhos na escola, transam menos (meme da Nazaré Tedesco para as mães-casadas-monogâmicas que estão pensando se transam menos). Todos esses dados eu consegui no CPTS –  Centro de Pesquisas Tireido Suvaco e duvido que alguém possa lhes negar veracidade.

Possivelmente vai ter pai aqui se solidarizando conosco e lamentando o “trabalho invisível da maternidade”. Vou chamar meus checadores de notícias para dizerem: mais uma inverdade. Mentira. Notícia falsa. Vocês estão desinformados. Resta saber se por ingenuidade ou por conveniência.

Repitam comigo: não existe trabalho invisível na maternidade, não existe trabalho doméstico feminino invisível. Está todo mundo vendo a gente se lascando. As pessoas apenas não ligam. Ou se aproveitam desta situação. Ou não ligam para se aproveitarem.

A escritora e ativista Flora Tristan há muitos e muitos anos escreveu: “a mulher é a proletária do proletariado.”

O patriarcado se beneficia da nossa mão de obra e chama de invisível e de instintivo um trabalho que mais escancarado e mais incentivado não há para poder se fazer de sonso.

Quando um homem sussurrar ao pé do ouvido que se revolta e se compadece da invisibilidade de seu excelente trabalho como mãe, dá uns beijos nele porque esse pode ser o fim de semana preciosíssimo da guarda compartilhada, mas depois meta-se logo um DIU para não procriar antes de conversar muito e muito e muito com esse homem sobre as maravilhas e as tretas da parentalidade.

Eu poderia ficar aqui escrevendo sobre mais consensos falsos que nos contam para nos amansarem. Por exemplo: 1) não existe pãe, gente; 2) não existe paternidade ativa, pai agindo é só um pai mesmo; 3) nem toda mãe que faz tudo é controladora, as vezes, ela só faz tudo poque o pai não divide nada.

Pais, mantenham-se informados das inúmeras possibilidades para a prática do afeto, do cuidado e do exercício da responsabilidade com seus filhos.

Feliz Dia dos Pais, pai, Feliz dia dos Pais, Bruno (e não digo isso porque minha analista pode ler esse texto e o clima da próxima sessão ficar estranho).

Feliz Dia dos Pais aos que se responsabilizam e estão disponíveis.

 

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Paula Campos

Advogada com experiência na gestão pública e em organizações da sociedade civil, nas áreas da cultura e infância.
Interessada nos impactos políticos relacionados ao uso de mídias sociais. Mãe do Joaquim.

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