Com a chegada da pandemia, muitas plataformas viram-se obrigadas a adotar medidas mais rígidas contra a desinformação. O Twitter está tentando reduzir as fake news sobre Covid-19 e implementando políticas mais duras contra o discurso de ódio. Mesmo assim, conteúdos tóxicos originários da rede social marginal Gab estão sendo reproduzidos na plataforma para atrair a atenção do público, segundo um relatório divulgado pela Liga Anti-Difamação (ADL, em inglês).
Entre 7 de junho e 22 de agosto, o Centro de Extremismo da ADL analisou quantos links redirecionando para a plataforma Gab foram compartilhados no Twitter. No total, foram mais de 112.000 tuítes contendo URLs para o Gab, divulgados por mais de 32.700 usuários com um alcance potencial de mais de 254 milhões de visualizações. Entre os 50 links mais compartilhados, a liga descobriu que eram em sua maior parte conteúdo conspiratório e desinformação, sendo alguns promovidos pelo próprio Gab por meio de sua conta verificada no Twitter.
Os termos mais compartilhados por esses tuítes eram relacionados à Covid-19 (como covid, vacina, vacinado). Referências políticas também eram dominantes nesses tuítes, com uma alta frequência de termos como Biden, Trump, América, eleição, presidente, estado vermelho, democratas e senado.
Na imagem que acompanha esta matéria, está a nuvem de palavras com os termos mais frequentes nos tuítes coletados.
Dentre os 50 links mais compartilhados, 16 promoviam desinformação ou teorias conspiratórias sobre a Covid-19. Um artigo do fundador do Gab, Torba, foi o segundo mais compartilhado, no qual ele ensinava formas de pedir “isenção religiosa” para a vacina Covid-19 em casos de obrigatoriedade no trabalho, na escola ou nas forças armadas. Segundo o estudo, esse link foi compartilhado mais de 1.900 vezes, alcançando quase sete milhões de visualizações potenciais no Twitter.
O terceiro link mais compartilhado foi um vídeo intitulado “Doutor destrói toda a narrativa covid”, no qual Dan Stock faz várias afirmações falsas sobre a Covid-19.
Outros tópicos bastante compartilhado pelos usuários do Gab no Twitter foram conteúdo antissemita (o mais disseminado foi um vídeo montado que mostrava um homem judeu bebendo vinho de forma que parecesse estar bebendo sangue) e conteúdo da teoria da conspiração QAnon. Dos 50 links mais compartilhados, 21 apontavam para conteúdo QAnon em japonês. Pesquisadores especulam que ao publicar esses tuítes em japonês, usuários estariam tentando burlar os algoritmos da plataforma, que detectam conteúdo sobre QAnon em alfabeto romano.
O estudo indicou que muitos dos conteúdos falsos ou enganosos publicados no Gab são compartilhados pela própria conta verificada da plataforma no Twitter. “Ao publicar conteúdo conspiratório ou desinformação em contas verificadas, os usuários estão mais propensos a acreditar, o que pode levar á propagação desse discurso mais fácil”, explica Wilson Ceron, pesquisador da Universidade Federal de São Paulo. “Por isso, é importante a plataforma tomar medidas mais duras em relação a estas contas”, conclui.
O que é o Gab?
O Gab é uma plataforma fundada por Andrew Torba em 2016 como uma alternativa ao Twitter. Segundo Torba, havia um grande monopólio do discurso pela esquerda e o Gab promoveria um ambiente para liberdade de expressão.
A plataforma acabou ganhando popularidade e tornou-se refúgio para extremistas, teóricos da conspiração e desinformação durante as eleições presidenciais mais polêmicas dos Estados Unidos. O Gab chegou a ser removido da Google Play Store por violar políticas relativas a discurso de ódio em 2017.
Durante a pandemia, Torba mostrou-se reticente das medidas adotadas e acabou promovendo ativamente desinformação sobre as vacinas de Covid-19, além de promover conteúdo enganoso sobre o ataque ao Capitólio em janeiro deste ano.