O Twitter anunciou que o encerramento da API gratuita, que começaria a valer hoje (9), foi adiada para a próxima segunda-feira (13). O plano básico custará mensalmente 100 dólares (cerca de 519 reais) e uma versão gratuita foi prometida. Cientistas e sociedade civil temem que medida ameace pesquisa de interesse público na rede social.
Por meio da publicação no perfil Twitter Dev, feita às 20h da última quarta-feira, a empresa comunicou que o pacote simples da funcionalidade oferecerá um “baixo nível de uso da API” e o acesso à API de anúncios.
Uma nova versão gratuita da ferramenta também foi citada no comunicado, com a limitação de até 1.500 tweets por mês por um único usuário autenticado. Mais informações sobre como esse serviço funcionará e para quem se destinará não foram esclarecidas.
No dia 2 de fevereiro, em conversa com usuários na rede social, Elon Musk justificou o pagamento da API pois o serviço estava sendo “muito abusado” por robôs golpistas e manipuladores de opinião. Na ocasião, o bilionário adiantou o valor estabelecido de 100 dólares, custo suficiente para “arrumar muita coisa”, segundo ele.
Já no domingo (5), o novo dono do Twitter voltou à rede social, afirmando que uma versão simples e livre da API seria disponibilizada para bots que que fornecem “bons conteúdos gratuitos”. A publicação, porém, não deixou claro o que ele considera “bons conteúdos” ou quem irá decidir isso.
A falta de informação da empresa é tanta que os projetos que utilizam a API ainda não foram orientados como devem proceder a partir do fim do prazo. O perfil Dólar Bipolar, que acompanha a variação da moeda americana, não tinha sido notificado sobre como proceder até a noite da quarta.
Logo após o novo anúncio da quarta-feira (8), usuários também relataram instabilidade na plataforma. Alguns não conseguiram seguir novos perfis, como uma espécie de bloqueio, sendo comunicados que o limite de follows foi atingido.
Custo de acesso a API impacta pesquisas científicas e projetos da sociedade civil
Se for mantida a conversão cambial, o plano básico no Brasil pode chegar a mais de 500 reais mensais. O valor é quase metade de um salário mínimo (estipulado em 1.300 reais) e um terço de uma bolsa de apoio à pesquisa científica para o mestrado (no valor de 1.500 reais). Como noticiou o *desinformante, atualmente a API Firehose, considerada uma das mais completas, custa cerca de 20 mil dólares ao mês.
A pesquisadora e professora da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), Marie Santini, alerta que muitos grupos de pesquisa brasileiros não vão conseguir pagar esse valor, afetando principalmente pesquisadores independentes e no no início da carreira que não têm acesso à financiamento.
Além disso, há a possibilidade de intensificar as disparidades entre a produção científica entre o norte e o sul global. “Isso é muito prejudicial para ciência, pois ficamos com um deserto de pesquisas no sul global, sem conseguir medir as consequências das redes sociais em relação a diversos temas, como a própria desinformação e manipulação da opinião pública”, explica a docente.
Temendo o impacto da decisão do Twitter no desenvolvimento de pesquisas científicas e em projetos da sociedade civil, a Coalizão de Pesquisadores Independentes de Tecnologia publicou esta semana uma carta aberta contra a medida.
O documento, assinado por 81 organizações internacionais e nacionais, pede que a empresa mantenha disponível e gratuita a ferramenta para jornalistas, acadêmicos e membros da sociedade civil. Aos políticos, a carta também solicita que se demonstre liderança e exija o acesso confiável a dados de uso público.
A coalizão afirma que a restrição, que agora passa a valer no próximo dia 13, vai interromper milhares de projetos críticos em todo mundo que estudam questões de interesse da sociedade, como desinformação, saúde pública e meio ambiente.
“As ações do Twitter ameaçam apagar as luzes da pesquisa, inovação e conhecimento coletivo essenciais. É por isso que estamos juntos para proteger os bens públicos que dependem do acesso de dados ao Twitter”, escreve a organização na carta.
A medida também foi criticada na União Europeia. Durante um evento do Serviço Europeu de Ação Externa, o diplomata da União Europeia, Josep Borrell, afirmou que a interrupção da API gratuita será um retrocesso em relação aos compromissos estabelecidos anteriormente pela empresa.
“Nós precisamos de mais transparência e responsabilidade, e não o contrário”, disse Borrell.