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@thiagoilustrado

Tabata, Talíria e Kamala e a violência política de gênero em 2024

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Tabata Amaral, Talíria Petrone e Kamala Harris são exemplos de candidatas a cargos públicos neste ano eleitoral de 2024 que estão passando por situações que podem ser vistas como violência política de gênero, considerada crime no Brasil pela Lei 14.192, de agosto de 2021.

No primeiro debate entre candidatos à prefeitura de São Paulo, no último dia 8 de agosto, o candidato Pablo Marçal (PRTB) chamou a deputada federal e também candidata Tabata Amaral (PSB) de “adolescente”, “jornalistazinha”.  “Tabata, vou te falar uma coisa, você precisa estudar além da headline. Você parece até uma jornalistazinha militante”, disse Marçal, que ainda pediu que a plateia ficasse em silêncio diante dos seus ataques.

A fala encerraria o 1º bloco do programa, já que Tabata não tinha réplica. “Essa adolescente aqui, que vive falando que representa as mulheres, mas precisa amadurecer. Silêncio. Tem como parar ô torcida kids?.”

No mês passado, a deputada federal Talíria Petrone (Psol-RJ) publicou um vídeo no Instagram contando que estava sendo ameaçada de morte e que o criminoso estava ordenando que ela renunciasse ao mandato e desistisse da candidatura à prefeitura de Niterói (RJ).

“O criminoso disse textualmente: ‘Talíria Petrone, sua macaca fedorenta, a milícia tem que te colocar no caixão’. E ele continua: ‘se você não renunciar ao seu mandato de deputada e à sua candidatura a prefeita de Niterói e abandonar a política, eu vou te matar’.”

De acordo com Talíria, a mensagem trazia, ainda, o endereço do gabinete, detalhes da rotina da deputada e da pré-campanha, “e como se não bastasse, ele cita nominalmente cada um dos meus filhos”.

Mais acima no mapa, a candidata do Partido Democrata às eleições para presidência dos Estados Unidos, Kamala Harris, não foi poupada por adversários e pela fúria das redes. No mesmo dia em que o atual presidente Joe Biden anunciou que desistiria da candidatura, Harris passou a ser alvo de desinformação e teorias da conspiração.

Em uma das postagens, uma montagem da vice-presidente em versão masculina sugeria que ela seria uma mulher transsexual nascida no exterior. “Você conhece este homem? Seu nome é ‘Kamal Aroush’. Ele nasceu em Bengasi. Kamal se tornou Kamala”, dizia o conteúdo. Outras postagens colocavam em xeque sua identidade negra.

Imagens editadas buscaram mostrar a vice-presidente ao lado de figuras como Jeffrey Epstein, financista acusado de tráfico e assédio sexual. Em outro vídeo, que mostra Harris se vacinando contra a Covid-19, sugere que a democrata teria recebido uma seringa sem agulha, dando a entender que ela não tinha sido imunizada contra a doença.

Aplicação da lei é desafio

Apesar da aprovação da Lei de Violência Política em 2021 no Brasil, a punição para este tipo de crime ainda é um desafio para a sociedade brasileira.

A lei de violência política tipifica o ato de assediar, constranger, humilhar, perseguir ou ameaçar, por qualquer meio, candidata a cargo eletivo ou detentora de mandato eletivo com a finalidade de impedir ou de dificultar a sua campanha eleitoral ou o desempenho de seu mandato eletivo, e prevê a pena de reclusão, de 1 (um) a 4 (quatro) anos, e multa. 

“A expectativa era que a lei nos trouxesse um amparo legal para que esses casos reduzissem, mas a gente tem muitos desafios em relação à aplicação de uma lei como essa”, disse, em 2023, em entrevista ao *desinformante a pesquisadora Fernanda Martins, diretora do InternetLab, que realiza, junto com a revista AzMina o MonitorA, Observatório de violência política e eleitoral contra candidatos(as) nas redes.

O MonitorA 2024 entra em ação a partir do dia 16 de agosto, quando se inicia a propaganda eleitoral no país. Na edição de 2022 do Observatório, apenas na primeira semana de campanha, 97 mulheres na disputa receberam quase 4,5 mil ataques e/ou insultos pelo Twitter. Alusões à loucura, histeria ou doenças mentais foram a principal forma encontrada pelos usuários do Twitter para se dirigir às candidatas a cargos do Executivo e do Legislativo brasileiros naquela eleição. À ocasião, o MonitorA registrou 518 aparições de termos como louca, doida, maluca, desequilibrada, histérica e descontrolada relacionados a candidatas.

 “Se temos uma sociedade machista, misógina, patriarcal e racista, criar uma norma não vai solucionar um problema que está na nossa estrutura, na forma em que a gente vive todos os dias”, afirma Ana Carolina Araújo, gerente de projetos de jornalismo e dados no Instituto AzMina.

Segundo ela, falta popularização dos dispositivos da lei, entendimento por parte das vítimas de que podem acionar seus direitos, principalmente as pequenas candidatas, que não têm acesso a uma estrutura legal.

O uso das ferramentas de IA generativa para produção de deepfakes preocupa Araújo e há pouco controle, por mais que existam normas eleitorais. “Dificilmente vamos conseguir controlar caso haja intenção de criar esse tipo de imagem em grande volume”, afirmou.

Plantão sigiloso dá apoio durante a campanha

Quem sentiu na pele a violência política de gênero quando era candidata à vice na chapa de Fernando Haddad à presidência, em 2018, é Manuela D´Ávila, que se tornou um símbolo da luta contra este tipo de violência e hoje dirige o instituto E Se Fosse Você?. Este ano o instituto lançou ano o “Plantão de Apoio Onde Ela Quiser!”. O serviço é destinado a mulheres eleitas nas esferas municipal, estadual e federal,  candidatas nas eleições de 2024, servidoras públicas no exercício da função, assessoras de mulheres candidatas e de eleitas, e mulheres com restrição no exercício dos direitos políticos.

Plantão de Apoio é um canal sigiloso, que possibilita à mulher buscar formas coletivas de enfrentamento, ter acolhimento psicológico, orientação jurídica, conhecer como tornar pública a denúncia do caso pelas redes sociais, receber orientação e encontrar recursos para lidar com a situação. 

“Temos duas situações simultâneas, uma é a aplicabilidade da lei (de violência de gênero) e outra é a proteção dessas mulheres durante o processo eleitoral porque enquanto elas estão lutando para que os direitos sejam garantidos elas ficam destruídas emocionalmente. Não é fácil lidar com a violência que se manifesta de diversas formas”, afirma Manuela D´Avila.

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