O julgamento do Supremo Tribunal Federal (STF) sobre a constitucionalidade do artigo 19 do Marco Civil da Internet está marcado para esta quarta-feira (17). O recurso que será analisado observa o regime de responsabilidade das redes sociais e esse movimento é visto como um pronunciamento do Judiciário diante do impasse do projeto de lei 2630 que está parado no Congresso Nacional há três anos.
O artigo 19 determina a necessidade de ordem judicial prévia de exclusão de conteúdo para a responsabilização civil de provedor de internet, websites e gestores de aplicativos de redes sociais por danos decorrentes de atos ilícitos praticados por terceiros. Ou seja, atualmente, a plataforma só pode ser responsabilizada por não remover conteúdo, exceto em casos específicos, caso tenha descumprido uma ordem judicial.
As ações foram pautadas pela ministra Rosa Weber no mesmo dia em que o Telegram fez uma ofensiva contra o PL 2630, inflando a ideia de que teria sido uma resposta do Supremo. A decisão do ministro Alexandre de Moraes sobre o caso do Telegram destaca a urgência de uma definição legislativa “ou judiciária”.
No entanto, o diretor do InternetLab Francisco Brito Cruz aponta que “esse debate sobre regime de responsabilidade não esgota a discussão regulatória”. Para Cruz, a eventual mudança da responsabilidade teria um efeito no tipo de conteúdo que fica ou não na plataforma a partir de uma análise do custo jurídico que aquele conteúdo tem, mas não toca em outras questões importantes.
“Investimento em sistemas de segurança, sistemas de detecção de conteúdo problemáticos, sistemas de análise linguística, contratação de equipes… Todas essas questões não estão garantidas se mudar o regime de responsabilidade. Eu acho particularmente isso muito limitado pensando no que a gente tem que avançar na regulação de plataformas”, explica.
Para o diretor do InternetLab, outro ponto de destaque – e para ele o mais central – que não é resolvido pela via judicial é a transparência. “Nenhuma transparência virá de uma de uma decisão sobre responsabilidade das plataformas e a transparência é fundamental para a gente saber no futuro que tipo de coisa que a gente tem que pressionar as plataformas”, complementa.
Brito Cruz participou do evento “Regulação das plataformas digitais no Brasil: o PL 2630 em contexto”, nesta segunda (15), ao lado da coordenadora do Comitê Gestor da Internet, Renata Mielli. O evento foi organizado pelo grupo de pesquisa Jornalismo, Direito e Liberdade da Universidade de São Paulo. Na oportunidade, Mielli também falou sobre o julgamento previsto pelo STF.
Em defesa do Marco Civil da Internet, a pesquisadora e coordenadora do CGI indica que o artigo 19 não impede as plataformas de fazerem nada ou de moderarem nada, apenas pontua em que casos ela será responsabilizada. “Não é verdade que mudar o regime de responsabilidade vai melhorar a qualidade da informação que circula no âmbito dessas plataformas”, acrescenta Mielli.
Além disso, Renata destaca que o artigo 19 não fala apenas de rede social, mas sim de ‘provedores de aplicação de internet’, o que engloba uma variedade de outros atores. “O WordPress é um provedor de aplicação. Se a gente muda o regime de responsabilidade, o que acontece com o WordPress que hospeda metade dos sites brasileiros? Veja que na ânsia de resolver um problema a partir do senso comum, de que as plataformas precisam ser responsáveis, você gera um outro problema que é muito maior”, explica.
Sobre o regime de responsabilidade, o Comitê Gestor da Internet lançou uma nota no início de maio defendendo que o artigo 19 do Marco Civil não fere nenhum artigo da Constituição Federal, mas ao mesmo tempo apoiando as mudanças propostas pelo PL 2630, que incluem uma responsabilização das redes sociais pelo conteúdo impulsionado que causar danos em terceiros.