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Pontos de vista

Acervo Pessoal

jan 16, 2023 | pontos de vista

Provas digitais: o que pode ser usado para identificar e punir os envolvidos nos atos golpistas?

Acervo Pessoal
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O dia 08 de janeiro de 2023 entrou para a história brasileira como um lamentável registro de atos terroristas e golpistas, daqueles que não aceitaram o resultado legal e legítimo das urnas e tentaram abolir o estado democrático de direito, na intenção de aplicar um golpe de estado.

As cenas de horror e vandalismo puderam ser vistas na sede dos Três Poderes. Os terroristas invadiram e depredaram o patrimônio público, histórico dos brasileiros e da humanidade. Tanto o Congresso Nacional, quanto o Palácio do Planalto e o edifício-sede do Supremo Tribunal Federal não foram apenas fisicamente depredados, mas obras de arte valiosíssimas foram total ou parcialmente destruídas.

Cita-se a obra “As mulatas”, de Di Cavalcanti, avaliada em R$8 milhões, com rasgos em sete locais diferentes; a obra “O Flautista”, escultura em bronze de Bruno Jorge, avaliada em R$250 mil, totalmente destruída; o Relógio de Balthazar Martinot, presente da Corte Francesa para Dom João VI, de valor inestimável, e que só existem duas peças no mundo, uma no Palácio de Versailles e a outra aqui no Brasil, foi totalmente destruído. O Brasão da República que fica no plenário do Supremo Tribunal Federal foi arrancado e vandalizado; as cadeiras dos Ministros e o plenário do STF foram totalmente vandalizadas. A bancada de votação no plenário da Câmara dos Deputados; o Vitral ‘Araguaia’, de Marianne Peretti, e as esculturas de Ulysses Guimarães e o Anjo, de Alfredo Ceschiatti, tiveram de ser limpas por servidores da Câmara dos Deputados. Além do mais, vidros, janelas, portas, equipamentos eletrônicos, móveis, dentre outros, foram igualmente danificados.

Obra “As Mulatas” antes de ser depredada no dia 8 de janeiro / Palácio do Planalto

As ações do dia 08 de janeiro, somadas aos atos anteriores, como o episódio da bomba no caminhão de combustível próximo ao aeroporto de Brasília, no dia 24 de dezembro de 2022, constituem, em tese, crimes previstos nos artigos 2º, 3º, 5º e 6º (atos terroristas, inclusive preparatórios) da Lei nº 13.260, de 16 de março de 2016, e nos artigos 288 (associação criminosa), 359-L (abolição violenta do Estado Democrático de Direito) e 359-M (golpe de Estado), 147 (ameaça), 147-A, § 1º, III (perseguição), 286 (incitação ao crime), todos do Código Penal.

Ressalte-se que até mesmo o ex-Presidente da República, Jair Bolsonaro, passou a ser investigado no Inquérito 4.921, por ter cometido, em tese, incitação pública à prática de crime, ao postar vídeo no dia 10 de janeiro questionando a regularidade das eleições presidenciais de 2022.

Assim, além da prisão do então Secretário de Justiça do Distrito Federal, Anderson Torres e do afastamento do governador do DF, Ibaneis Rocha, ambos determinados no Inquérito 4.879 (atos antidemocráticos); e da intervenção federal no âmbito da segurança pública, para identificar, responsabilizar e punir todas as pessoas que participaram dos atos terroristas, foram adotadas medidas judiciais de identificação desses agentes criminosos. Neste mesmo inquérito, foi determinado que a Polícia Federal obtenha todas as imagens das câmeras do Distrito Federal, para o uso do reconhecimento facial dos terroristas; e que as empresas Facebook e Instagram (Grupo Meta), TikTok e Twitter bloqueiem canais/perfis/contas citados na decisão, com o fornecimento de seus dados cadastrais ao STF.

As medidas têm por objetivo: identificar esses agentes, interromper os canais de comunicação, articulação, organização e monetização de atos terroristas e golpistas, impedir a propagação de desinformação, seguir o dinheiro usado para financiar esses atos e identificar os organizadores e financiadores desses atos, a fim de responsabilizar, civil e criminalmente, todos eles.

A partir da identificação do endereço das postagens dos golpistas, com o link das publicações – lembre-se que o Ministério da Justiça e a Polícia Federal disponibilizaram canais de recebimento de denúncias desses atos -, além dos próprios terroristas e golpistas filmarem suas ações e disponibilizarem vídeos e fotos em suas redes sociais, produzindo provas contra eles mesmos, é possível identificar cada terrorista.

Assim, além das provas periciais feitas no local, a produção de provas digitais é essencial para determinar a materialidade e autoria dos crimes. Para tanto, o ministro Alexandre de Moraes determinou que as empresas de aplicação de internet (Grupo Meta – Facebook e Instagram -, Twitter e TikTok) guardassem os dados referentes aos registro de acesso a aplicações de internet (metadados referentes à postagem: IP, dia e horário da publicação); preservassem cópia da publicação (fotos e vídeos – provas do crime); informassem o alcance da publicação (número de visualizações, número de compartilhamentos e número de comentários); e excluíssem o conteúdo das publicações do acesso para o público em geral. Estas medidas são importantes para assegurar a identificação futura dos usuários, ao mesmo tempo que removem o conteúdo golpista e de desinformação, enfrentando a propagação de notícias mentirosas, descontextualizadas e, no caso concreto, de prática de crime e de incitação a novas condutas criminosas.

Posteriormente, para identificar os usuários das redes sociais, as empresas de conexão (Claro, Vivo, Tim, por exemplo) deverão informar os dados pessoais dos responsáveis pela contratação da internet, usada nos aparelhos de celular, computador, tablet etc., das pessoas que participaram dos atos terroristas.

Também foi determinado o uso de reconhecimento facial para a identificação dos terroristas, a partir de imagens de câmeras nos Três Poderes, nas vias públicas e hotéis, por exemplo, autorizando a Polícia Federal a obter todas as imagens das câmeras do Distrito Federal; e a geolocalização (informações de operadoras de celular) dos usuários que estavam nas imediações da Praça dos Três Poderes e do Quartel-General do Distrito Federal, para apuração de responsabilidade nas datas dos eventos criminosos.

Por último, foi determinado ao Tribunal Superior Eleitoral, a utilização de dados biográficos e de identificação civil para auxiliar na localização de pessoas envolvidas nos atos terroristas.

Conclui-se que as provas digitais auxiliarão o Poder Judiciário a determinar os indícios de autoria e materialidade, para instrumentalizar a ação judicial cabível a fim de responsabilizar, civil e criminalmente, cada um dos terroristas que não só depredaram patrimônio público, mas atentaram contra o Estado Democrático de Direito.

Democracia para sempre!

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Evelyn Melo Silva

Advogada. Mestranda em Direito Público pela UERJ. Especialista em Direito Digital. Membro da Comissão de Direito Constitucional, de Direito Eleitoral e de Proteção de Dados e Privacidade da OAB/RJ.

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