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Vienna Filmes

jan 15, 2024 | pontos de vista

Onde (e como) a pauta digital vai entrar na Cúpula do G20

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O Brasil colocou a pauta digital em alta na Cúpula do G20, o encontro dos líderes das maiores economias do mundo e que este ano está marcado para 18 e 19 de novembro no Rio de Janeiro. Mas bem antes das presenças ilustres dos chefes de Estado, que praticamente ratificam e assinam o documento final com diretrizes e recomendações para os desafios globais, tem todo um trabalho de formiguinha de ministros de estado, diplomatas, pesquisadores, professores e especialistas, abaixo do radar, que já começou. 

O debate da desinformação foi contemplado no Grupo de Trabalho (GT) de Economia Digital com o nome de integridade da informação. O Ministério das Comunicações lidera o GT, que também inclui debates sobre outros temas como conectividade, governos digitais e inteligência artificial. 

Na vertente específica da desinformação, a expectativa brasileira, de bastidor, é construir um acordo global acerca da regulação de plataformas digitais. Há resistências, mas há bons apoiadores como os países europeus que já estão vivendo a era de normatização das redes sociais através do DSA (Digital Services Act) ou Lei de Serviços Digitais. Especialmente Alemanha e França podem ser os grandes aliados do Brasil para levar essa pauta adiante no documento final do G20. 

Trabalhando para atender a esta expectativa de acordo global em torno de medidas regulatórias para o meio digital estão dois grupos da sociedade civil organizada: o T20 (Think Tanks 20) que é um grupo de engajamento multissetorial  com participação do setor privado, da academia, instituições e organizações dos 20 países do bloco, numa perspectiva de dar mais oxigenação aos debates oficiais do G20; e o C20, coordenado pela Associação Brasileira de Organizações Não Governamentais e que inclui um grupo sobre digitalização e tecnologia. 

No T20 há seis forças-tarefas para dar conta de todos os temas propostos. A pauta digital está na Força-Tarefa 5, que tem o título de Transformação Digital Inclusiva. Um dos líderes deste grupo é o Data Privacy Brasil, organização para proteção de dados e dos direitos digitais.  

Aqui é importante uma análise cuidadosa, me disse o Bruno Bioni, do Data Privacy, que lidera esta força-tarefa junto com Anirban Sarma, da ORF, organização indiana de pesquisadores em políticas públicas. 

“Não queremos só discutir transformação digital, mas uma que seja inclusiva. Vamos utilizar o T20 como espaço em que as proposições sobre direitos digitais seja inclusiva e não reforce assimetrias de poder e fossos digitais”, afirmou o professor e fundador do Data Privacy. 

Na próxima semana devem ser anunciados os 20 componentes da Força-Tarefa de pesquisadores e especialistas que vão se debruçar sobre a pauta digital inclusiva. E a expectativa é que integrantes do Sul Global superem, em número, os do Norte, o que também marca a posição para o objetivo pretendido pelos líderes. 

O que isso quer dizer na prática? Temos muito mais similaridades que distâncias no modo de uso das redes sociais e aplicativos de mensagens com países como África, Índia e Equador, por exemplo.  Temos menos preparo educacional para as mídias digitais que os países do Norte Global. Faz sentido amealhar nossas histórias e desafios, bem como os danos perversos que atingem populações mais vulneráveis na maioria global. Temos uma Cúpula do G20 no Brasil e há de se aproveitar disso para além dos flashes da bela vista da baía da Guanabara. Como já disse aqui Nina Santos, em Ponto de Vista anterior, há janelas de oportunidades para o avanço da pauta digital este ano e uma delas é o Encontro do G20. 

Nas agendas oficiais preparatórias, que se estendem ao longo do ano, segundo integrantes do Executivo,  o governo brasileiro vai trabalhar para responder às quatro perguntas a seguir: 

  1. Quais são as diferentes estratégias e abordagens de governança disponíveis para lidar com a questão da integridade da informação online?
  2. Que nível de compromisso as plataformas digitais deveriam observar com relação à integridade das informações e à promoção das informações como um bem público?
  3. Que tipo de análise técnica das políticas de combate à desinformação e ao discurso de ódio, bem como do modelo de negócios das plataformas digitais, deveria ser estimulada como forma de fornecer insumos para discussões multilaterais?
  4. Como os países podem lidar com o desafio urgente imposto pelos sistemas de Inteligência Artificial generativa à integridade da informação nos ambientes digitais?

Note que o governo parte de alguns pressupostos. Primeiro a informação é um bem público e, portanto, deve haver algum nível de responsabilidade das plataformas digitais para com a sua integridade. Veja que o momento de debater se as plataformas digitais devem ser responsabilizadas ou não por danos causados pela desinformação já passou. A experiência de qualquer país e as pesquisas estão aí com farto material para quem ainda duvidar dos efeitos colaterais do modelo de negócios digital. O outro ponto que chama atenção é que não é mais possível monetizar conteúdo enganoso, desinformativo ou odioso. Que tipo de mecanismos as empresas vão adotar para proteger o ecossistema digital? A impressão é que foi passada uma terceira marcha no debate. Vamos ver quem vai acompanhar o ritmo. 

A pergunta que toda essa gente envolvida na Cúpula do G20 vai precisar responder é COMO fazer isso sem ferir direitos – como o de liberdade de expressão – garantindo os direitos fundamentais e enfrentando os interesses puramente econômicos.

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Ana d'Angelo

Editora do *desinformante. Jornalista, mineira radicada no Rio, mestre em Comunicação e Semiótica (PUC-SP). Pesquisa convívio e comunicação, on e off.

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