O mercado de moderação de conteúdo está em expansão. Até 2026, segundo a Business Wire, espera-se que esse nicho alcance um crescimento de até 12,6%. Mesmo assim, ainda pouco se sabe das dinâmicas e lógicas trabalhistas que estruturam este cenário global.
Com o objetivo de entender melhor esse contexto, os pesquisadores Gabriel Penna, Emanuella Ribeiro e Thiago Tavares mapearam vagas de moderador de conteúdo em plataformas corporativas ao redor do mundo e identificaram que o mercado global está concentrado na Europa e na Ásia.
Das 342 propostas de emprego encontradas pelos autores do estudo, 54,6% delas estão centralizadas em países europeus. Irlanda, Portugal e Alemanha foram as nações com mais oportunidades, oferecendo, respectivamente, 40, 37 e 30 vagas para moderadores de conteúdo.
Os resultados da pesquisa, explicou Gabriel ao *desinformante, seguem a lógica da divisão internacional de trabalho, com um acúmulo de capital e de empresas nos países do norte global.
“O que conseguimos concluir é que a moderação de conteúdo a nível global parece estar sendo realizada em algumas poucas cidades que possuem atrativos trabalhistas ou são pontos estratégicos por causa de fluxos migratórios ou por pressão de regulamentação”, comentou o pesquisador.
Os fluxos migratórios da região europeia, por exemplo, facilitam a contratação de trabalhadores com diversos conhecimentos linguísticos. Já as pressões legislativas incentivam o trabalho de monitoramento local, como é o caso da Alemanha, onde a lei NetzDG, também conhecida como “Lei Facebook”, obriga que as redes sociais removam conteúdos ilegais em até 24 horas após publicados.
O estudo também identificou uma forte presença de países asiáticos, como a Índia e a Malásia. O continente com maior tráfego online do mundo e com barateamento da força de trabalho somou 27,15% das vagas totais achadas pelos pesquisadores. As Filipinas também apareceram como hub majoritariamente de empresas terceirizadas de moderação de conteúdo.
Já as Américas reuniram 12% das vagas, enquanto a África 5,5%. Nos Estados Unidos, por exemplo, foi identificado um grande número de cidades com moderação de conteúdo, indicando um espalhamento em relação a outros países. Por lá, foram ao menos 18 cidades com vagas. Os EUA também foram o país com maior número de empresas sede, 24 ao total.
Moderação em português
O estudo encontrou 86 ofertas de emprego de moderação de conteúdo em língua portuguesa em 39 cidades de 22 países. Desse montante, os Estados Unidos apareceram na frente com 24,4% das vagas, seguido por Brasil (12,8% da amostra) e Portugal (11,26% da amostra), estes dois últimos sendo os únicos na lista com o português como língua oficial.
No Brasil, os pesquisadores encontraram empregos oferecidos pelas próprias plataformas digitais. Ainda de acordo com Gabriel, “foram identificadas vagas de plataformas locais e de grande porte que utilizavam os próprios recursos humanos para fazer moderação de conteúdo, como o TikTok”.
Em Portugal e EUA, porém, prevalecem vagas de empresas terceirizadas especializadas em moderação de informação, que prestam serviços a grandes plataformas.
A dianteira norte-americana no mercado de moderação em língua portuguesa faz lembrar as críticas realizadas ao Facebook pela ex-funcionária Frances Haugen sobre baixos investimentos em moderação regional de línguas que não são o inglês.
Essa situação pode resultar, por exemplo, em erros nas análises de informações realizadas tanto pelos sistemas de Inteligência Artificial como pelos próprios moderadores humanos, justamente por ambos não identificarem de maneira ideal os contextos dos discursos, como expressões regionais, gírias e até piadas de uma determinada região ou grupo populacional.
“Problemas contextuais podem levar tanto a falsos negativos, manutenção de conteúdos que são danosos nas redes sociais; como falsos positivos, a deletar conteúdos que são legítimos dentro dos critérios e das regras das comunidades”, explica Penna.
A falta de vagas em português nos países africanos, como Moçambique e Cabo Verde, também apontam para uma possível lacuna de moderação de conteúdo regional nessas localidades. “Como a gente não encontra moderação de conteúdo na África, é possível que haja moderação de conteúdo do português nas suas variedades africanas em Portugal e no Brasil”, alertou o pesquisador.