O órgão fiscalizador da internet na China, a Administração do Ciberespaço da China (CAC), divulgou, no final de agosto, um rascunho de um projeto de regulamentação para impor regras mais rígidas para o uso de algoritmos de recomendações por plataformas de informações na internet em todo o território chinês. Considerada inovadora, a medida promete uma espécie de revolução na regulação das plataformas.
De acordo com a proposta, as empresas que fornecem serviços dirigidos por algoritmos de recomendação devem revisar e melhorar mecanismos de segurança, assim como divulgar o monitoramento de informações. Ao regular esses algoritmos, a China tenta indiretamente atacar um problema global: a desinformação. Especialistas e cientistas políticos criticam as bolhas criadas por esses modelos computacionais, que podem facilitar a radicalização das discussões em grupos e aumentar as crenças em notícias falsas.
Por outro lado, as regras elaboradas evidenciam o desejo do CAC de controlar a opinião pública e moderar o conteúdo das redes sociais. Segundo a revista Protocol, que publicou parte do rascunho da regulação, os provedores de serviços devem “manter as orientações de valor predominantes” e otimizar os mecanismos de recomendação para “disseminar a energia positiva”. As empresas de tecnologia são impedidas de “inserir palavras-chave ilegais ou indesejáveis como interesses do usuário ou como marcas de usuário” nem podem “definir rótulos de usuário discriminatórios ou tendenciosos”. Por outro lado, também informa que as empresas não têm permissão para enviar a usuários menores de idade qualquer conteúdo que possa prejudicar sua saúde mental e física, nem podem fazer recomendações que induzam ao vício em internet.
Essas medidas têm como objetivo controlar as gigantes de tecnologia do país, como ByteDance, Tencent e Kuaishou Technology. Para o jornal Folha de S. Paulo, o pesquisador da FGV, Luca Belli, explicou que a China está tentando “enquadrar” essas empresas de tecnologia, algo semelhante ao que fazem Europa e Austrália com Facebook e Google. Belli lembra que algumas das medidas da nova legislação são similares às adotadas por plataformas ocidentais, como a inclusão de especialistas externos em conselhos que possam avaliar e orientar as políticas das plataformas, em relação ao uso de dados, a gestão de algoritmos e a segurança da informação.
Especialistas apontam que existe um interesse da China em se firmar como potência e exportar um modelo de regulação da internet. “Esta política marca o momento em que a regulamentação de tecnologia da China não está simplesmente acompanhando as regulamentações de dados na UE (União Europeia), mas foi além deles”, explicou Kendra Schaefer, especialista em dados e tecnologia do Trivium China no Twitter .
O anúncio veio junto de outras duas medidas que também impactam diretamente os gigantes de tecnologia do país. O governo chinês resolveu impor a crianças e jovens um limite de uma hora de jogo por dia às sextas-feiras e aos fins de semana durante o período letivo. Nas férias, essa uma hora é liberada durante todos os dias da semana.
Foi aprovada também pelo Congresso chinês uma nova legislação de proteção de dados pessoais, que impede a coleta sem consentimento e impõe regras para o armazenamento. O objetivo, segundo o governo, é proibir práticas que “incentivem o vício ou alto consumo” e ponham em perigo a segurança nacional, segundo Bloomberg.