Mais de 87 milhões de nigerianos foram às urnas no último sábado (25) escolher o próximo presidente do país. Ainda sem resultado final, a disputa acirrada foi marcada por problemas com tecnologia de biometria que trazem crise de credibilidade e inflam narrativas de fraude eleitoral. Denúncia de falha na contenção de desinformação por parte de rede social também foi registrada durante o final de semana.
Pela primeira vez, o país mais populoso do continente africano utilizou sistemas digitais para verificação dos votantes. A tecnologia de reconhecimento facial e de impressão digital, aplicada com o objetivo de trazer mais transparência e melhorar a credibilidade eleitoral, não conseguiu impedir problemas no andamento do pleito.
Defeitos nos aparelhos atrapalharam a votação de alguns eleitores, fazendo com que a Comissão Nacional Eleitoral Independente, órgão responsável pelas eleições, estendesse o prazo final para um segundo dia em algumas áreas. Demora na divulgação dos primeiros resultados também foi registrada no domingo (26).
A comissão chegou a se desculpar pela lentidão no compartilhamento dos resultados e justificou tal situação pela grande escala da votação realizada. O órgão afirmou que não houve nenhum tipo de intrusão ou sabotagem no sistema, dizendo que “esses resultados não podem ser adulterados”.
Alexis Akwagyiram, editor do Semafor, explicou que os problemas técnicos inflamaram narrativas de fraude eleitoral, impulsionadas também por uma desconfiança generalizada de corrupção endêmica na cultura política nigeriana e por um contexto de disputa acirrada entre o atual governo e a oposição.
“Essa preocupação pode se transformar em suspeita, violência e pessoas contestando os resultados finais se os problemas tecnológicos permitirem que dúvidas sobre a credibilidade da eleição aumentem”, escreveu Alexis.
Aliados do candidato de oposição, Atiku Abubakar, já levantam questionamentos sobre uma possível manipulação dos resultados – que apontam vitória para o governista Bola Tinubu – e pedem a anulação das eleições, conforme noticiou a Reuters.
Além dos problemas técnicos, o histórico de falhas e fraudes nas eleições passadas da Nigéria ajuda a minar a credibilidade eleitoral do país, tornando a situação delicada em relação a demais eleições internacionais que também registraram narrativas de fraude, como nos Estados Unidos e, recentemente, no Brasil.
Twitter falha em mitigar desinformação nas eleições nigerianas
O pesquisador Kofi Yeboah denunciou a demora do Twitter em retirar conteúdo desinformativo sobre o pleito nigeriano. De acordo com ele, ainda no sábado, um perfil compartilhou uma fake news alegando episódios de violência em partes da Nigéria utilizando, para isso, um vídeo de um exercício militar em Gana.
Apesar dos checadores confirmarem a falsidade da narrativa, o Twitter não removeu o conteúdo, adicionando apenas uma nota contextual na publicação.
“O vídeo continua sendo visto e algumas pessoas na Nigéria pensam que isso é verdade”, escreveu Kofi, que vê relação no fluxo desinformativo com as recentes demissões na plataforma, após a compra por Elon Musk.
Dias antes das eleições nigerianas, Angela Oduor Lungati, diretora executiva da organização não governamental Ushahidi, já havia abordado a falta de atenção das plataformas na moderação de conteúdos durante eleições nos países africanos.
De acordo com a executiva, o Quênia, que recebeu eleições presidenciais em 2022, também identificou um fluxo de desinformações com o objetivo de minar a integridade eleitoral do país, apesar de promessas das plataformas, como Facebook e Twitter, de reforçar atividades para impedir isso.
“Em suma, as plataformas devem levar as eleições e questões africanas muito mais a sério. Eles precisam investir, pelo menos, tanta energia e pessoal aqui quanto em outros lugares”, escreveu Angela.
A falta de moderação de conteúdo no continente africano foi um dos pontos evidenciados também por pesquisadores brasileiros em recente pesquisa, que mostra a Europa como centro dessa atividade.
Em janeiro deste ano, a maior provedora de moderação de conteúdo para o Facebook na África, a Sama, anunciou que irá interromper suas atividades para a gigante de tecnologia a partir de março. A companhia também prevê cortes de 3% no quadro de funcionários, principalmente em Nairobi, no Quênia.Já em dezembro, o Facebook foi processado por estimular violência na Etiópia. Os denunciantes alegam que falta recursos humanos na moderação de conteúdo, permitindo que postagens com violência ganhem as redes livremente.