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Acervo pessoal

out 11, 2021 | pontos de vista

Facebook: falta de transparência e uma série de erros levaram à crise atual

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Nos últimos meses, o grupo Facebook Inc. viu uma enxurrada de críticas sobre suas plataformas, como Instagram, WhatsApp e o próprio Facebook. Essa crise ficou mais evidente depois de uma série de reportagens baseada em documentos internos vazados ao jornal americano Wall Street Journal, incluindo relatórios de pesquisa, discussões on-line com funcionários e rascunhos de apresentações por parte da administração.

Em resumo, as reportagens mostravam em detalhes que as plataformas do grupo estão repletas de falhas que causam danos aos seus usuários. Nesses documentos, os pesquisadores da empresa identificaram os efeitos nocivos e apontavam para a alta cúpula. Apesar das audiências no Congresso, denúncias na mídia e por parte de academia, a empresa fazia promessas de correção que não eram cumpridas. 

Em setembro de 2021, depois de a empresa lançar o primeiro relatório de conteúdo amplamente visualizado, alegando ser “a plataforma mais transparente da internet”, pesquisadores comprovaram que não era bem assim. O professor associado e pesquisador de mídias sociais da Universidade de Urbino, na Itália, Fabio Giglietto‬ foi o primeiro a detectar inconsistências nos dados disponibilizados pelo Facebook. Ao comparar os resultados do relatório com os dados que a empresa fornece exclusivamente aos pesquisadores, através do canal de Pesquisa Aberta e Transparência do Facebook (FORT), Giglietto‬ descobriu que eles não batiam.“É uma grande demonstração de que mesmo com pouca transparência, esses dados podem nos fornecer resultados surpreendentes”, disse Giglietto ao The New York Times. Isso levou inúmeros pesquisadores a terem que revisar suas pesquisas, já que esses dados vinham sendo explorados há mais de dois anos. Isso abalou a confiança depositada no Facebook.

O caso CrowdTangle 

Apesar de alegar ser a plataforma mais transparente, eventos recentes também mostraram o contrário. Em agosto, a empresa decidiu suspender as contas da equipe de pesquisadores da Universidade de Nova Iorque (NYU) por violar os Termos de Serviço. Mesmo a equipe contando com o apoio da empresa para alguns projetos, o Facebook viu os riscos que essas pesquisas traziam para a plataforma ao revelar suas falhas endêmicas. 

Em janeiro de 2021, após o motim do Capitólio americano, milhares de postagens desapareceram da plataforma CrowdTangle, segundo reportagem do jornal POLITICO. Apesar de a empresa alegar que foi um erro técnico e que as postagens voltaram a serem exibidas na ferramenta, a reportagem expunha que muitas mensagens ainda não estavam presentes no CrowdTangle. Essa é a única ferramenta disponibilizada pelo Facebook para  acesso aos dados públicos da plataforma, mesmo que de forma limitada. 

Porém, a ferramenta parece ser um pesadelo para os executivos da rede social porque ela revelou altos níveis de engajamento dos usuários com fontes de mídia partidárias, o que em muitos casos está associado à desinformação. Esses executivos entraram em confronto direto com o CrowdTangle. Em abril de 2021, o cofundador e chefe-executivo do CrowdTangle, Brandon Silverman, reuniu dezenas de funcionários em uma videochamada para dizer que eles estavam se separando. Funcionando de forma independente até então, a ferramenta foi incorporada à equipe de integridade do Facebook. Isso resultou na transferência de diversos funcionários para outras divisões da empresa, como a líder de treinamento do CrowdTangle, Naomi Shiffman, que foi incorporada ao Oversight Board. Da mesma forma, Silverman não estaria mais gerenciando a equipe do Crowdtangle no dia a dia.

Segundo o The New York Times, esse foi o resultado de uma batalha de cerca de um ano entre os executivos do Facebook sobre a transparência dos dados e sobre o quanto a rede social deveria revelar sobre seu funcionamento interno. A reportagem ainda aponta que esses executivos argumentavam que o Facebook deveria divulgar seletivamente seus próprios dados na forma de relatórios cuidadosamente selecionados, em vez de entregar as ferramentas para que pesquisadores e jornalistas possam descobrir por eles próprios, conforme é feito no canal de Pesquisa Aberta e Transparência do Facebook (FORT).

Essas incoerências revelaram que, infelizmente,  o Facebook não é a plataforma mais transparente da internet. Ao contrário, essas inconsistências apontam como a empresa do Vale do Silício ainda tem medo do escrutínio público, preferindo expor seus usuários aos riscos em vez de tratá-los. Da mesma forma, o trabalho de jornalistas e acadêmicos tem sido essencial para provocar a empresa em direção a melhores práticas. Após a série de reportagens do Wall Street Journal, a empresa anunciou que suspendeu o “Instagram Kids”, depois do vazamento de relatórios internos mostrando que a iniciativa poderia causar problemas de saúde mental e ansiedade em meninas. Esperamos que mais medidas contra a desinformação possam ser adotadas pelo Facebook e por todas as plataformas. 

 

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Mathias Felipe

Jornalista, cientista da computação e pesquisador, trabalhou para organizações do Brasil e do exterior. Interessado nas mudanças da prática jornalística, em particular dados e novas tecnologias.

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