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reprodução do site Da Vuelta al voto de Milei

Extrema direita insiste no discurso de fraude e uso de IA turbina a reta final na Argentina

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A dois dias do segundo turno das eleições presidenciais na Argentina, o país vive um cenário de tensão e incerteza. A disputa acirrada entre o atual ministro da economia Sérgio Massa (União pela Pátria) e o ultradireitista Javier Milei (A Liberdade Avança), está sendo marcada pelo uso intensivo das redes sociais, alegações de fraude eleitoral e conteúdos sintéticos produzidos por Inteligência Artificial, isso tudo em meio a um aumento da inflação que promete disparar logo após as votações de domingo, dia 19 de novembro.

Desde as primárias, realizadas em agosto deste ano, a comunicação por meio das plataformas digitais vem sendo um elemento fundamental na corrida eleitoral. Como explica Natalia Aruguete, professora da Universidade de Quilmes, tal estratégia está sendo utilizada por ambos os lados da disputa, intensificada por Massa após a vitória no primeiro turno, em outubro.

Mas é Milei quem ganhou destaque no uso das redes sociais, atingindo principalmente adolescentes e jovens argentinos. O candidato autodenominado anarcocapitalista utiliza o TikTok para compartilhar posicionamentos antipolítica e suas propostas controversas, como a extinção do Banco Central e redução de ministérios. Na rede chinesa, até o meio-dia desta sexta-feira (17), o candidato de extrema-direita somava 1,5 milhão de seguidores com conteúdos que chegavam a mais de 5 milhões de visualizações.

“Ele conseguiu uma ótima penetração entre os usuários de redes sociais, ganhando visibilidade entre grandes setores da população que não o teriam conhecido de outra forma”, avaliou Natalia.

João Guilherme Bastos, diretor de Análises do grupo de pesquisa Democracia em Xeque, também destaca que, entre os candidatos na disputa argentina, a extrema-direita foi quem conseguiu alcançar estratégias inovadoras de comunicação digital. “Milei vem de um partido sem tanto lastro, por isso é muito importante usar os meios de comunicação, principalmente a comunicação digital, que tem um público jovem relevante e que não teve contato com alternativas fora do kirchnerismo”, comentou o pesquisador.

Ainda na avaliação de Bastos, o peronismo, movimento o qual representa Massa, já possuía uma base forte e consolidada. Além disso, os ataques online sofridos pelo candidato governista fizeram com que o político assumisse uma estratégia mais fechada em relação ao engajamento digital, com comentários bloqueados em postagens.

Frente a esse contexto, reações ao crescimento da extrema-direita também estão aparecendo no próprio ecossistema digital argentino nesta reta final, como o projeto Da Vuelta el Voto de Milei, que fornece conteúdos verificados para que as pessoas compartilhem com os amigos e conhecidos que ainda estão indecisos, algo semelhante a iniciativas brasileiras nas últimas eleições, como o “Vira Voto”.

Apoiadores de Milei alegam fraude eleitoral

Com Milei ganhando notoriedade nos últimos meses, a Argentina também está presenciando o aumento do discurso que questiona a integridade eleitoral, como ocorreu no Brasil e Estados Unidos durante as campanhas de Jair Bolsonaro e Donald Trump. De acordo com uma pesquisa realizada pela empresa AdHoc, entre os dias 22 e 31 de outubro, logo após os resultados do primeiro turno, a palavra “fraude” teve um crescimento 400% nas redes sociais do país.

Em entrevistas logo após a vitória nas primárias, Milei já havia afirmado que o pleito teria sido fraudado, argumento ainda repetido por ele e apoiadores nos últimos dias.  “O interessante é que, em 40 anos de democracia, não tivemos nenhuma eleição anterior em que o espectro da fraude fosse encorajado com tanto ímpeto”, disse a Natalia Aruguete, pontuando também que a desinformação é utilizada como estratégia pelos dois campos políticos.

Nas palavras da pesquisadora argentina, a segurança eleitoral do país é comprovada e muito difícil de ser burlada. “Uma das razões pelas quais a fraude eleitoral seria impossível é que se trata de um sistema fortemente descentralizado com diferentes níveis de escrutínio, o que torna impossível modificar o resultado de uma eleição por meio de uma manobra fraudulenta”.

O projeto Chequea, considerado uma das principais entidades contra desinformação na Argentina, em meio a falta de ações institucionais, mostrou que os discursos de fraude também estão invadindo o TikTok, principal plataforma utilizada por Milei, enquanto outros tipos de informações falsas, como conteúdos descontextualizados, estão presentes no X (antigo Twitter).

Eleição argentina experimenta popularização da IA generativa

Outro ponto que vem chamando atenção é o surgimento de diversos conteúdos políticos produzidos com ajuda da Inteligência Artificial generativa. Um deles, desenvolvido pela campanha de Massa, mostra imagens sintéticas para ilustrar a Guerra das Malvinas e relacionar falas de Milei de admiração a Margaret Thatcher. “Um país não pode ser governado por quem admira os inimigos”, traz o final do vídeo.

Por outro lado, imagens falsas criadas por apoiadores de Milei também tentam desfavorecer o oponente na corrida eleitoral. Uma dessas peças é uma deepfake de Massa se drogando. Ao Globo, fontes da campanha de Massa afirmaram que a tecnologia é essencial para a equipe de estrategistas do candidato, enquanto representantes da candidatura de Milei negaram o uso, mas admitiram que os sistemas são utilizados por apoiadores. Esta semana, o The New York Times chegou a considerar as eleições argentinas como as primeiras no contexto global com a aplicação em massa da tecnologia.

João Guilherme Bastos lembra que, apesar dessas ferramentas trazerem, de fato, dinâmicas mais descentralizadas e econômicas de produção de conteúdo sintético, peças alteradas já faziam parte de campanhas políticas antigas em outros países. Em 2017, por exemplo, um vídeo deepfake com rostos de políticos britânicos e da União Europeia rodou a Internet durante as eleições do Reino Unido naquele ano.

“O ChatGPT trouxe a discussão de inteligência artificial a cena, mas isso não quer dizer que, enquanto isso não estava sendo discutido amplamente, não estava acontecendo”, pontuou o pesquisador.

No Brasil, vídeos antigos em apoio a Bolsonaro também já usavam colagens, associando o político da extrema-direita ou seus oponentes a personagens de filmes, como ocorre agora com Milei. “É de se esperar que, uma vez que os apoiadores estão usando de modo recorrente essas ferramentas, no próprio celular sem precisar fazer um grande investimento, eles vão aproveitá-las, assim como fazem com os memes”, concluiu Bastos.

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