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jul 29, 2022 | destaques, notícias

Desinformação gera violência política

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“Desde 14 de março de 2018, quando assassinaram a minha irmã, naquela mesma noite a gente teve o primeiro contato com fake news e desinformação”, relatou Anielle Franco ao *desinformante, referindo-se ao assassinato de Marielle Franco, então vereadora da cidade do Rio de Janeiro: “eram fake news gritantes, uma coisa muito covarde que fizeram com a imagem dela”. Antes de ser um caso isolado, é recorrente o uso da desinformação como ferramenta de violência política, principalmente contra mulheres, pessoas negras, indígenas, quilombolas e LGBTQIA+.

A Organização dos Estados Americanos (OEA) caracteriza violência política como uma ação, conduta ou omissão realizada de forma direta ou por meio de terceiros, podendo se materializar por meio de agressões físicas, psicológicas, morais, sexuais, virtuais, institucionais, raciais, de gênero, LGBTQI+fóbicas, entre outras, e podendo ser cometidas contra candidatas/os, eleitas/os, nomeadas/os ou na atividade da função pública.

O relatório sobre O papel das plataformas na proteção da integridade eleitoral, assinado por mais de 100 organizações da sociedade civil, traz um capítulo específico no qual ressalta que o fenômeno da violência política de gênero e raça no Brasil é histórico e estrutura as bases de formação do país. E acrescenta: “trabalhamos com a categoria de violência política de gênero e raça para destacar a importância da observação em primeiro plano de vivências de mulheres negras, indígenas, quilombolas, mulheres cis, transexuais, travestis, pessoas intersexo e de outras identidades de mulheres invisibilizadas e negligenciadas”.

Com o avanço da participação desses grupos na política institucional, “verifica-se o recrudescimento da violência política contra mulheres negras e indígenas, cujos mandatos e exercícios de direitos políticos se encontram em risco” analisa o relatório, para concluir que “entendemos que a desinformação contra mulheres negras, cis, trans e travestis, políticas e defensoras de direitos humanos, é, assim, uma das formas de violência política de gênero e raça”.

Para a Organização dos Estados Americanos (OEA), um dos “principais obstáculos à real participação das mulheres na vida política é a violência. Apesar de que, há alguns anos, o assunto gere discussões, estudos e campanhas, a violência sofrida pelas candidatas, particularmente durante a campanha eleitoral, é um dos principais óbices à sua plena participação, bem como uma violação de seus direitos e um risco para suas vidas e as de suas famílias”, enfatiza o documento publicado em 2022.

Débora Thomé, pesquisadora na Columbia University com foco na participação da mulher na política, afirmou que o Brasil está na lanterna latino-americana quanto à representatividade feminina em cargos de decisão. “A cota de 30% vem sendo obedecida, mas as mulheres não têm sido eleitas ou não querem se candidatar novamente. E a principal razão alegada é a violência que sofrem”. O Congresso Nacional tem 15% de parlamentares mulheres. O Brasil tem mais de 5 mil municípios e apenas oito mulheres prefeitas. “Precisamos que a lei da violência política seja cumprida e os partidos precisam atender ao que ela determina”, afirmou Thomé em audiência pública realizada em 29 de junho.

A coordenadora da área de desinformação do Instituto Marielle Franco, Brisa Lima, lembrou que a violência que se dá através das plataformas digitais não são apenas atos simbólicos, mas afetam as pessoas no mundo offline e atrapalham o avanço da participação das mulheres negras e população LGBTQIA+ na política, dois grupos preferenciais dos ataques, por exemplo. De acordo com uma pesquisa realizada pelo Instituto em 2020, 78,1% das lideranças negras entrevistadas relataram ter sofrido algum tipo de violência virtual, sendo este o tipo de violência política mais relatada.

Compreendendo esse cenário e visando construir um contexto mais favorável a essas populações vítimas de violência política nas eleições de 2022, o relatório “O papel das plataformas na proteção da integridade eleitoral”, divulgado com a campanha #DemocraciaPedeSocorro, apresenta sete propostas:

1. Atualizar os termos de uso das plataformas, incluindo entre suas políticas de combate ao discurso de ódio, o fenômeno social da violência política, observando a Lei de violência política e a Lei dos crimes contra o Estado democrático de direito.

2. Garantir que as políticas de moderação de conteúdo estejam atualizadas para lidar com os casos de violência política de modo a considerar contextos brasileiros, com especial atenção para candidatas e candidatos que sejam oriundos de grupos historicamente marginalizados. Garantir:

  •  Remoção célere de postagens que ameacem candidatas e candidatos com violência física, violência sexual ou morte, e que glorifiquem, incitem ou elogiem a violência contra as mulheres, pessoas negras, indígenas, quilombolas e LGBTQIA+,
  •  Eliminação de discurso de ódio malicioso direcionado às mulheres, pessoas negras, indígenas, quilombolas e LGBTQIA+, incluindo discurso violento, objetificador ou desumanizante, declarações de inferioridade e termos sexuais depreciativos;
  • Remoção de contas que violam repetidamente os termos de serviço ameaçando, assediando, fazendo exposição de dados pessoais (doxing) e atacando mulheres, pessoas negras, indígenas, quilombolas e LGBTQIA+ que sejam candidatas ou lideranças públicas;
  • Remoção de imagens ou vídeos manipulados que façam uso de discurso de ódio ou violência política para deturpar figuras públicas mulheres, pessoas negras, indígenas, quilombolas e LGBTQIA+.

3. Oferecer formações direcionadas a candidatas/os e suas equipes que as orientem em como fazer denúncias de casos em que são vítimas de violência política.

4. Criar forças-tarefa para garantir que haverá celeridade nas respostas aos casos de violência política direcionada às candidaturas de pessoas pertencentes a grupos historicamente marginalizados, fazendo com que os danos às candidaturas sejam os mínimos possíveis.

5. Comprometer-se com formações para suas equipes de moderação de conteúdo e desenvolvimento de produtos de otimização, redução ou não de visibilidade e organização da informação para o contexto brasileiro e idioma português.

6. Criação de comitê consultivo que seja composto por pesquisadores(as) e membros da sociedade civil para avaliar casos e ações e orientar as atualizações das plataformas com relação às dinâmicas de violência política contra grupos historicamente marginalizados.

7. Realizar campanhas publicitárias orientadas para diferentes tipos de usuários, considerando faixas etárias, identidade de gênero e sexualidade, para combater a violência política contra mulheres, indígenas, quilombolas, pessoas negras e LGBTQIA+.

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