O fact-checking, ou checagem de fatos no bom português, é uma das importantes saídas contra a desinformação. Confrontando dados com declarações, as agências buscam determinar o que é verdade ou mentira no mar de informações que circulam pelas redes, e esse não é um trabalho nada fácil. Para entender como funciona o trabalho do checador de fatos, o *desinformante conversou com a jornalista da Agência Lupa, Nathália Afonso.
O primeiro passo para checar algo é escolher o que será checado. “Essa parte é vital para o nosso trabalho porque desse monitoramento vamos ver o que faremos ao longo do nosso dia”, explica Nathália. As iniciativas de fact-checking, principalmente as signatárias do Internacional Fact-checking Network (IFCN), buscam deixar explícita a metodologia utilizada para a verificação.
A Lupa deixa claro que dá prioridade à checagem a partir de três critérios: “quem fala”, “o que fala” e “que barulho faz”. Essa escolha vem a partir do monitoramento da agenda pública, acompanhando as autoridades e seus compromissos e discursos, e a partir do monitoramento de redes sociais. É preciso, além de uma boa leitura do material, entender qual conteúdo precisa ser checado primeiro para diminuir o impacto que a informação falsa pode causar.
No dia a dia da redação, a jornalista explica que a equipe se reúne para debater as temáticas e delimitar o que seria a ‘pauta da semana’, principalmente de olho se acontecerá algum discurso de autoridades ou evento de relevância. Além disso, há um acompanhamento do que circula nas redes.
No Facebook, como explica Nathália, o acompanhamento se dá por meio de uma ferramenta que a própria big tech disponibiliza através do projeto de verificação ‘Third Party Fact Checker Project’. Nesse espaço o Facebook reúne todo o material que é denunciado como falso pelos usuários da plataforma e disponibiliza aos checadores cadastrados (os signatários do IFCN) para a verificação.
“Observamos diariamente esse material e selecionamos o que é passível de checagem, pois nem tudo que está lá conseguimos checar”, aponta a jornalista. Após a verificação, caso seja uma informação falsa, o Facebook afirma que reduz o alcance da publicação e oferece informações seguras para o usuário.
Outra forma de acessar os conteúdos virais nas redes é por meio dos próprios usuários que enviam conteúdos para checagem via WhatsApp da agência. Os checadores analisam se é um material passível de checagem, visto que não são checadas opiniões, conceitos amplos ou futuro/tendências.
Além disso, os jornalistas também utilizam ferramentas para encontrar os conteúdos que mais estão sendo compartilhados e que possuem o maior engajamento para as verificações. Depois do monitoramento e escolha do material, o checador parte para a verificação em si.
“Eu acho que é um pouco complicado dizer um passo a passo da checagem porque depende muito do conteúdo. Se eu for uma imagem, uso ferramentas de busca reversa, mas se eu for checar dados sobre um estudo, preciso ir realmente na informação oficial do estudo”, comenta a checadora. As investigações, portanto, variam de acordo com o que é verificado, assim, os fact-checkers utilizam muitos dados públicos e oficiais para essa busca, o que algumas vezes pode tornar o trabalho mais complicado.
“Para mim, um dos maiores desafios da checagem é que a gente acaba esbarrando em vários momentos com a falta de transparência dos governos e instituições”, destaca Nathália ao relatar que às vezes a “pauta cai” por falta de informações disponíveis sobre determinado assunto.
Texto e etiquetas
Após a verificação das informações por meio de dados públicos, relatórios oficiais e até pesquisas acadêmicas, o jornalista-checador confronta os achados com as declarações para redigir o texto e inserir a etiqueta para o material checado. Neste momento, o fact-checking se distancia mais um passo do jornalismo tradicional por focar na transparência das informações. Ou seja, todo o material consultado para aquela apuração é colocado no texto final por meio de hiperlinks.
“Temos um compromisso de transparência com o leitor em todos os momentos, então no texto colocamos todos os links utilizados e contextualizamos a informação completa para que o leitor possa se informar e até refazer os nossos passos na apuração”, reforça Nathália. Além disso, para dirimir erros, há uma dupla certificação do material, ou seja, duas pessoas revisam e editam o material a fim de verificar todas as informações colocadas pelo jornalista.
A produção do texto da checagem também envolve a escolha da etiqueta a ser utilizada, uma das “marcas registradas” do fact-checking, apesar de não ser uma unanimidade. A agência Lupa, por exemplo, possui nove etiquetas.
Já o site de verificação Aos Fatos possui sete: verdadeiro, impreciso, exagerado, insustentável, contraditório, distorcido e falso. O Fato ou Fake, editoria do Grupo Globo, geralmente utiliza três marcações, ‘fato’, ‘fake’ ou ‘não é bem assim’. Ou seja, as classificações tendem a variar de iniciativa para iniciativa.
Mas a verificação não termina após a publicação do material. Uma das prerrogativas do fact-checking é estar aberto a correções caso surjam novos dados ou haja um erro no conteúdo publicado. “A gente tem uma equipe de redes sociais que nos auxilia bastante nesse sentido de avisar quando há uma crítica construtiva para o trabalho e quando precisamos rever algo”, comenta Nathália.