A disseminação de desinformação nas redes sociais não envolve apenas o famoso “tio do zap” ou um usuário comum que inocentemente – ou não – encaminha determinada mensagem. Como já mostraram artigos acadêmicos e conteúdos jornalísticos, podem existir verdadeiras organizações por trás de uma “simples fake news” e com objetivos bem específicos para manipular o discurso político. Alguns desses ambientes são conhecidos como fazendas de trolls.
As fazendas de trolls são grupos, muitas vezes financiados por governos, empresas e partidos para a criação de perfis falsos que compartilham e engajam determinado discurso escolhido a fim de manipular o debate público nas redes. Um dos maiores exemplos é a Internet Research Agency (IRA), uma instituição russa que, de acordo com estudos, “executou uma campanha online para minar a eleição presidencial dos EUA em 2016, procurando acentuar os conflitos sociais existentes para afetar o comportamento eleitoral de grupos seletos”.
Um relatório produzido por um ex-cientista de dados sênior do Facebook e aprofundado pelo MIT Technology Review indica que as fazendas angariavam um grande público por meio de páginas na plataforma, alcançando 140 milhões de usuários nos Estados Unidos durante um mês.
Em 2020, centenas de contas foram removidas pelo Facebook por comportamento inautêntico coordenado, ou seja, pela automatização de perfis para impulsionar, neste caso, a campanha de Donald Trump. “A fazenda de trolls pró-Trump estrangeira estava sediada na Romênia e publicava conteúdo no Instagram sob nomes como BlackPeopleVoteForTrump e no Facebook sob We Love Our President”, noticiou a NBC News. Apesar de ter sido “desativada”, o modelo segue sendo exportado para muitos outros países.
Como destacou o El País ainda em 2017, esse é um problema global: “Em pelo menos 30 países os governos empregam ‘exércitos de formadores de opinião’ para difundir suas ideias, impulsionar suas agendas e rebater as críticas nas redes sociais, segundo um relatório publicado na semana passada pela instituição Freedom House”.
O MIT pontua que as fazendas de trolls “afetam principalmente os Estados Unidos, mas também têm como alvo o Reino Unido, Austrália, Índia e países da América Central e do Sul”. O pesquisador Jonathan Ong esmiúça como a trollagem política impulsiona a desinformação e se tornou uma “opção” de trabalho nas Filipinas, transformando-se em uma atividade paralela lucrativa para muitos jovens no Sul Global.
“O trabalho cotidiano da produção de desinformação inclui a criação e manutenção de contas falsas, a criação de memes positivos e negativos (de “ataque”) e o monitoramento de páginas da grande mídia em busca de notícias para as quais possam expressar apoio ou atacar em massa, dependendo dos caprichos de seus clientes. Os trabalhadores da desinformação de baixo nível geralmente são recém-graduados que buscam renda extra por meio de um trabalho paralelo de curto prazo. A temporada eleitoral, que dura três meses, mas envolve um período mais longo de preparação, em que os estrategistas políticos começam a mobilizar seus exércitos de cliques e a apresentar seu portfólio aos políticos, apresenta muitas oportunidades para quem busca dinheiro extra”.
Esse é, de acordo com Ong, um dos modelos que alimentam a desinformação nas Filipinas, combinados a outros financiados pelo Estado ou até mesmo com equipe interna. A atuação desses grupos alerta para o problema global dessa propaganda massiva, principalmente em períodos eleitorais.
O funcionamento das fazendas de trolls lembra bastante o mecanismo das fazendas de cliques, tema já abordado pelo *desinformante. A engrenagem é bastante similar, apesar de os propósitos serem diferentes.