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acervo pessoal

dez 6, 2021 | Pontos de Vista

Como falar sobre fake news para a multidão

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Neste dezembro em que completa um ano da experiência de Covid em família que, por caminhos tortos, acabou me trazendo ao *desinformante, é inevitável voltar aos sentimentos de medo e ansiedade, mas também voltar a minha inquietação sobre como comunicar desinformação a cada uma das pessoas e também para a multidão. Me lembra o colega querido de jornal, Danilo Jorge, que dizia ter pouca ambição no jornalismo: “Quero apenas abalar os pilares da república”, brincava. Acabou virando pesquisador visitante do IPEA.

Nos safamos do vírus, eu, meu pai, mãe, irmã. Mais de 600 mil não tiveram a mesma sorte, incluindo aí minha sogra querida dona Stella. Estamos vivos – ou mais ou menos –  voltando de uma guerra e já com outra pela frente. Não falo de ômicrom, mas das eleições 2022. Nem o corona nem o vírus da desinformação parecem querer ceder no curto prazo e essa insistência precisa de cientistas, recursos, governos, jornalistas e dos cidadãos.

Como jornalista experimentada já suspeitava que a revolução tecnológica traria consequências no mínimo imprevistas, mas um mundo inteiro se descortinou quando li pela primeira vez sobre os cenários que forjam o problema da desinformação, fruto do trabalho de pesquisa de João Brant e Nina Santos. Quantas pessoas sabem que este é um problema tão complexo e que sobrevive graças a conivência intensa de empresas, governos e organizações. Como o meme do Batman, me dirão: é o capitalismo, paspalha!

Sim. E ao pensarmos na arquitetura das plataformas, especialmente a dos aplicativos de mensagens, que se tornaram onipresentes no Brasil sem qualquer questionamento, também entendemos como o modelo favorece o repasse rápido e impensado de qualquer conteúdo, um fluxo que gera lucro, movimenta as redes e impactou de forma definitiva as eleições de 2018.

O trabalho das instituições e das agências de checagem, neste sentido, é extremamente essencial, porém lento se comparado à velocidade da mentira e seus efeitos imediatos.

Mas boto fé na turma do Deleuze quando diz que na mesma potência que tenta controlar alguma coisa escapa do controle. A resistência das brechas, daqueles cantinhos do ´tanto bate até que fura´ são a tábua de salvação em um fim de ano esperançoso-ressabiado, depois de tanta pancada.

Entretanto, o mesmo complexo cenário e algoritmos levam a consequências danosas e muito reais como abrem janelas e possibilidades para que possamos, inclusive, falar sobre elas. Usando o Facebook, por exemplo, divulgamos sobre o vazamento das informações da ex-funcionária Frances Haugen, que mostrou por A mais B que a empresa estava ciente da desinformação circulante, mas pouco fez para proteger seus usuários.

No Instagram colocamos em xeque a política de monetização do grupo Meta (Facebook, Instagram e WhatsApp) e seus critérios duvidosos para financiar pseudo mídias. Discutimos no Papo Desinformante no Youtube se as plataformas devem ter tanto poder sobre o que consumimos e decidir o destino de nossos conteúdos.

Descortinamos camadas e camadas do problema da desinformação, mas o desafio lá do início permanece igual. Ao aprofundarmos no assunto, conhecemos uma pá de gente boa que está mergulhada em entender este funcionamento, seus impactos, suas implicações tanto pra quem pede um Ifood quanto para quem entrega.  Mas como o debate chega para quem entrega a comida? Para quem é feito nosso trabalho de jornalista ao tentar traduzir aquilo a que os pesquisadores se dedicam?  A quem ele chega?

Tivemos respostas instigantes como a do Francisco Bosco, em live do ciclo Conversas sobre Desinformação, de que o sujeito que crê em e compartilha as fake news faz isso pelo gozo de pertencer a um grupo e entrar em confronto com outro. O sentido de pertencimento é o que move, no entendimento de Bosco.  Posto assim, sabemos o que move, mas não o que demove o sujeito do ciclo da desinformação.

O mediale pfade, organização alemã que estimula reflexões sobre racismo, sexismo e todas as formas de extremismo que tomaram as redes, apresentou  algumas ideias sobre a condução do debate acerca de fake news. Para o diretor Fidel Bartholdy, o julgamento afasta as pessoas, então é preciso perguntar, ouvir e discutir com tranquilidade o assunto. O sujeito pode estar, antes de tudo, assustado e amedrontado.

O desafio está no ar! Seguimos com ele ao longo de 2022, este ano que já vem com a etiquetagem perturbador e decisivo. Alcançar públicos, falar com as pessoas, mas pera aí. Essa ambição desmedida não combina com os novos tempos. Se não formos capazes de ouvir a multidão em sua diversidade e singularidade, o passo adiante será torto.

Precisamos conhecer as histórias de quem é vítima da desinformação, quem sofreu por uma fake news, quem caiu em golpes na rede. E como esperançar é um imperativo de final de ano também teremos antenas e acolhimento para saídas, projetos nascidos nos quatro cantos do Brasil, iniciativas da sociedade civil, dos governos locais, do legislativo, judiciário de quem deseja ver um mundo um pouco mais justo. Falando pra vocês falo para mim e para todos nós que estamos construindo o *desinformante.

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Ana d´Angelo

Ana d´Angelo é mineira, mestre em Comunicação e Semiótica pela PUC-SP, mãe do José e editora do *desinformante.

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