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fev 20, 2025 | Destaques, Notícias

Efeitos da concentração de mercado das plataformas são debatidos em audiência do Cade

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O Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) realizou nesta quarta-feira (19) uma audiência pública para discutir a concorrência de sistemas operacionais em dispositivos móveis. Enquanto o Google e a Apple, detentores do sistema Android e iOS respectivamente, defenderam que seus produtos garantem segurança aos usuários e mantêm o mercado inovador, organizações da sociedade civil questionaram os efeitos econômicos, políticos e sociais da concentração de mercado por essas gigantes do setor.

A discussão (que está disponível aqui) girou em torno de práticas relacionadas tanto aos sistemas operacionais como às lojas de aplicativos que já são integradas a esses modelos. Google e Apple estão sob investigação do órgão, que busca analisar se as práticas das lojas ferem princípios concorrenciais.

O diretor geral da Associação Brasileira de Defesa ao Consumidor (Proteste), Henrique Lian, pontuou críticas específicas para o modelo de negócios da Apple, que, segundo ele, opera em dinâmica verticalizada, aplicando taxas “exorbitantes” para a disponibilização de aplicativos e práticas de “lock-in”, aprisionamentos tecnológicos que dificultam ou impedem a migração para outros sistemas.

“A Apple é a empresa que mais abusa de seu poder de mercado no ambiente digital, impedindo a interoperabilidade entre plataformas, lucrando excessivamente às custas dos desenvolvedores e prendendo os consumidores no seu ecossistema digital”, afirmou Lian.

“Ao contrário do que foi afirmado pela Apple e Google, não vemos mercados digitais extremamente competitivos ou vibrantes, inovadores e dinâmicos”, afirmou Camila Leite, Coordenadora do Programa de Telecomunicações e Direitos Digitais no Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec). “O que vemos é concentração de mercado e dependência do ponto de vista dos consumidores.”

A audiência do Cade foi um dos primeiros movimentos do governo sobre o tema da regulação econômica das plataformas, uma das principais pautas que serão destaque neste ano no Brasil. O tópico foi considerado uma das 25 prioridades estabelecidas pelo Ministério da Fazenda no biênio 2025-2026 que foram entregues no início do mês aos novos presidentes do legislativo.

Em outubro passado, a Secretaria de Reformas Econômicas do ministério (SRE/MF) apresentou um relatório sobre os aspectos econômicos das plataformas digitais. No documento, a secretaria alerta que o poder econômico associado a essas empresas configura uma nova estrutura de poder de mercado e que há uma lacuna para identificação e correção de distorções.

Efeitos da concentração vão além dos aspectos econômicos

Representantes de organizações da sociedade civil que estavam na ocasião pontuaram que a concentração de mercado tem efeitos que vão além dos aspectos econômicos, podendo impactar também em questões políticas e sociais.

“A falta de concorrência em mercados digitais afeta o acesso à informação, à liberdade de expressão e à democracia e outros direitos fundamentais”, pontuou Camila Leite.

Helena Martins, representante da Coalizão Direitos na Rede (CDR) e do Diracom (Direito à Comunicação e Democracia), lembrou o episódio em que o Google utilizou a própria página inicial de busca para fazer lobby contra o avanço do Projeto de Lei 2630, que buscava criar regras de transparência para as plataformas digitais. 

“Muitos desses monopólios digitais controlam o acesso à informações e bens culturais fundamentais para a população e suas escolhas podem significar limitar a diversidade do debate público, comprometendo a democracia”, afirmou Helena.

Raquel da Cruz Lima, coordenadora do Centro de Referência Legal da ARTIGO 19, comparou as plataformas como gatekeepers (pessoas ou atores que controlam o acesso no ambiente comunicacional) de direitos humanos. “Essa concentração tem o poder de moldar o que a Internet é ou o que ela pode ser”, disse Raquel.

Regulação na pauta

A necessidade de uma regulação específica para impedir condutas abusivas nos ecossistemas digitais foi discutida na audiência do Cade. O próprio órgão vem estudando a possibilidade de implementação de uma regulação ex-ante, ou seja, que cria regras de caráter preventivo. Uma das principais referências é a Lei de Mercados Digitais da União Europeia (o DMA, na sigla em inglês), que foi aprovada junto com a Lei de Serviços Digitais (o DSA).

O diretor jurídico da Apple para América Latina, Pedro Pace, afirmou que a regulação da área deve ser pensada conforme as necessidades locais do país, questionando a implementação de legislações internacionais que, segundo ele, tem “benefícios pouco claros”.

“A Apple espera que o Cade evite a criação ou importação de um regime estrangeiro que iniba a capacidade da Apple de ofertar aos brasileiros seus produtos e serviços de características incomparáveis”, disse Pace. A Apple, inclusive, terá até o dia 28 para responder ao Cade sobre uma acusação de “privacy washing”, medidas de privacidade que são implementadas para restringir a a concorrência, realizada pela Meta.

A necessidade da regulação, inclusive tomando como referência o DMA europeu, foi defendida por representantes da sociedade civil brasileira. “A regulação econômica se configura como importante instrumento para contrapor o modelo de negócios das empresas proprietárias de grandes plataformas digitais e enfrentar esses danos causados por elas”, defendeu Helena Martins.

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