Diversos autores têm caracterizado o ecossistema de mídias atual como um “ambiente de alta escolha informativa”. Isso marca a passagem de um momento em que a produção de informação estava concentrada em poucos produtores para o momento atual, em que as fontes são incontáveis. Do lado do consumo, isso significa que, ao menos em teoria, os cidadãos passam a ter também uma oferta muito maior de fontes de informação para escolher.
Quando falamos que as pessoas estão consumindo cada vez mais informações através de mídias sociais, como revela o Digital News Report 2021, o que afinal isso quer dizer? As pessoas fazem usos muito diferentes das redes sociais digitais. Elas podem usar para consumir conteúdos dos seus amigos, de mídias alternativas e, claro, também das mídias tradicionais, que hoje têm nessas mídias um dos seus principais canais de distribuição. O mais comum é que as pessoas consumam um mix disso tudo, mas com diferentes pesos.
É importante ressaltar, no entanto, que nem tudo está sob poder do usuário. A infraestrutura das redes, a forma como elas estão desenhadas e suas lógicas de funcionamento também direcionam o tipo de conteúdo a ser consumido. A forma como o conteúdo é organizado pelos algoritmos e apresentado aos usuários é um elemento que não pode ser ignorado na circulação informativa. Uma série de estudos têm investigado fenômenos como filtros bolhas, exposição seletiva e câmaras de eco como consequências da plataformização dos meios de comunicação. Em um estudo sobre os motivos da exposição seletiva, Cardenal et al. (2019), por exemplo, diferenciam a escolha – referida como exposição voluntária – e a filtragem algorítmica – quando se trata de exposição involuntária, promovida pela estrutura das plataformas.
Há ainda outros incentivos a determinadas práticas de consumo informativo como o chamado ‘zero rating’. Ele se caracteriza pelo acesso a determinados aplicativos sem consumo de dados móveis. No Brasil, onde grande parte das pessoas têm pacotes de dados limitados, poder acessar determinadas redes – e os conteúdos que circulam nelas – sem ter que pagar a mais por isso é, certamente, um grande incentivo. Assim, com a atuação de algoritmos e obstáculos de acesso, cada usuário vai compondo a sua cesta com as informações as quais tem acesso, mesmo que limitadas.
Exemplo marcante
O relatório (Pseudo) Ciência e Esfera Pública, da Diretoria de Análise de Políticas Públicas (DAPP) da Fundação Getúlio Vargas (FGV), apontou que 44% das fontes de informação usadas em um cluster bolsonarista no Twitter não eram usadas por nenhum dos outros grupos que participavam do debate. O estudo analisou mensagens sobre a Covid-19 que reivindicavam argumentos científicos.
Esses resultados vão na mesma direção de outras pesquisas já realizadas. Um estudo anterior sobre fontes de informação usadas por apoiadores e críticos do presidente Jair Bolsonaro no Twitter mostrou que apenas ⅓ das fontes acionadas pelos dois grupos eram comuns. Ou seja, ⅔ das fontes citadas são usadas apenas pelos apoiadores do presidente, sendo ignoradas pelos críticos e vice-versa. Isso mostra uma cisão importante na forma como as pessoas constroem suas percepções sobre o mundo.