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Reprodução do Estudo ITS/RSF

set 23, 2021 | Notícias

Ataques a jornalistas nas redes são políticos, misóginos e organizados

Reprodução do Estudo ITS/RSF
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Os ataques digitais a jornalistas cresceram 222% no Brasil entre 2019 e 2020, segundo o relatório Voces del Sur. Pesquisas têm mostrado que essas tentativas de descredibilizar a imprensa têm três características básicas: estão associadas a posicionamentos políticos, atingem sobretudo mulheres jornalistas e são estrategicamente organizadas.

Uma pesquisa feita pela organização Repórteres Sem Fronteiras (RSF) em conjunto com o ITS Rio identificou meio milhão de tweets com hashtags de ataques à imprensa brasileira (#imprensalixo, #extreamaimprensa, #globolixo, #cnnlixo e #estadaofake) entre os meses de março e junho deste ano. O maior pico de ataques à imprensa aconteceu no dia 10 de maio, quando mais de 36 mil mensagens foram postadas. Neste dia, o jornal O Estado de S.Paulo publicou uma reportagem sobre um esquema de orçamento paralelo, utilizado para liberar verbas para emendas parlamentares.

Esse achado confirma dados já apontados por um estudo anterior, feito pela Unesco. A organização entrevistou 714 mulheres jornalistas de 125 países e concluiu que, segundo as participantes, a maior parte dos ataques estava associada à publicação de matérias relacionadas a questões de gênero (47%), política (44%) e direitos humanos e políticas sociais (31%). Ou seja, os temas políticos estão entre os que mais geram ataques.

O levantamento do RSF/ITS também identificou as principais hashtags que aparecem nas mensagens de ataque à imprensa e a maioria delas é de apoio ao governo federal. Essa associação não acontece à toa tendo em vista que o próprio presidente Jair Bolsonaro está entre os atores que a pesquisa identifica como aqueles que mais atacam jornalistas.

Não se trata de uma especificidade brasileira, já que no estudo da Unesco, feito com jornalistas de 125 países, os atores políticos também aparecem como os maiores responsáveis pelos ataques (37%), atrás apenas daqueles que não têm atores identificados (57%). Nem por isso o caso brasileiro deixa de chamar atenção. Aqui, em 2020, a Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo (Abraji) identificou 312 ataques à imprensa que tiveram origem no âmbito estatal (74%), enquanto 92 começaram foram dele e 15 não foram identificados.

O viés de gênero

A pesquisa do RSF/ITS também mostrou que, em sua base de dados, a quantidade total de tweets mencionando jornalistas mulheres foi 13 vezes maior do que em relação aos seus colegas homens. Eles identificaram termos depreciativos como safada(o), vagabunda(o), puta(o), burra(o), ridícula(a), idiota, arrombada(o) e imbecil em 10% do total de mensagens, mas quando o recorte era apenas de tweets direcionados a jornalistas mulheres, essa taxa subia para 50%.

Além dos ataques serem mais frequentes, as mulheres encontram poucos canais para denunciar esse tipo de agressão. Segundo as entrevistas feitas pela Unesco, apenas 25% das mulheres jornalistas atacadas denunciaram o ocorrido a seus empregadores. Entre as que denunciaram, muitas ficaram sem resposta (10%), foram incentivadas a “serem mais fortes” (9%) ou foram questionadas sobre o que fizeram para provocar os ataques (2%).

Algumas jornalistas também buscam as próprias redes para relatar esse tipo de ataque, mas também não conseguem ser ouvidas. Em matéria da Agência Pública, seis jornalistas brasileiras relataram como fizeram denúncias ao Twitter sobre postagens que violavam suas políticas, mas foram ignoradas.

Ação automatizada

Para dar vazão a ambições políticas e atingir as mulheres como alvos preferenciais, os ataques são estrategicamente organizados. 41% das jornalistas entrevistadas pela Unesco disseram que foram alvo de campanhas orquestradas de desinformação online. Ou seja, elas identificaram não a ação de indivíduos isolados, mas uma articulação mais ampla e organizada.

Essa organização não está apenas na percepção das vítimas. Segundo o relatório do RSF/ITF, cerca de 20% do total de tweets de ataque foram publicados por contas com alta probabilidade de comportamento automatizado. Isso não indica necessariamente que se trata de uma ação que encontra lastro social, ou seja, que não tem pessoas participando. O que esse dado mostra é que existem contas possivelmente automatizadas sendo usadas para amplificar o movimento e dar uma impressão de que ele é maior do que realmente é.

 

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