Já se tornou comum ver posts publicitários dos nossos influenciadores preferidos nas redes sociais, momento em que eles divulgam os produtos ou marcas de patrocinadores. O marketing de influência, no entanto, também está se especializando em desinformação.
O The New York Times publicou recentemente uma reportagem expondo a indústria da ‘desinformação contratada’ e como ela pode estar influenciando o debate público sem que a gente perceba.
Em maio, uma investigação realizada pelo netzpolitik.org e ARD Kontraste seguiu a apuração de um tweet postado pelo youtuber alemão Mirko Drotschmann. Ele recebeu uma proposta de ‘publipost’ onde, em vez de produtos, precisaria divulgar informações sobre vacinas, especificamente, a da Pfizer. O problema é que essas informações eram falsas.
O esquema parecia simples: uma empresa de marketing, chamada Fazze, entrava em contato com influenciadores com uma proposta comum no mercado – pagar para que eles falassem sobre determinado tema. No entanto, as instruções deixavam claro que o influenciador não poderia mencionar que o conteúdo era patrocinado. Ele deveria produzir um conteúdo que soasse natural, reforçando a prática chamada de astroturfing (simular uma ação espontânea ao passo que foi patrocinada por alguém ou alguma organização).
Mirko não aceitou a proposta. No entanto, pela investigação da mídia alemã, há indícios de que o youtuber brasileiro Everson Zoio teria produzido o conteúdo. O jornalista Daniel Laufer, que atuou na apuração, compartilhou com a equipe do Desinformante o vídeo capturado, em maio, do Instagram de Everson. O conteúdo foi apagado após o contato para esclarecimentos.
O vídeo, que já contava com mais de 83 mil visualizações, seguia o script. O youtuber mencionava um material do jornal francês Le Monde e chamava para um link em sua bio, o mesmo encaminhado pela Fazze, de acordo com o site da companhia a que Daniel Laufer teve acesso.
O youtuber apresentava-se de forma “espontânea”, supostamente preocupado com a taxa de mortalidade entre os que receberam a vacina da Pfizer. Ela seria três vezes maior que a dos vacinados com a Astrazeneca. As informações partiam do roteiro preparado pela Fazze. Um youtuber indiano também fez um vídeo com informações similares e fazendo uso do mesmo link de Everson.
O link se referia a uma tabela que mostrava o número de mortes de pessoas até 40 dias após receber a vacina. Ainda não se sabe quem patrocinou esta ação deliberadamente enganosa. O trabalho jornalístico rastreou a Fazze até a empresa de marketing digital Adnow, com sede no Reino Unido e na Rússia. Um dos sócios da empresa, Ewan Tolladay, disse à BBC que a Fazze era de responsabilidade de um outro sócio russo, Stanislav Fesenko, e que não conhecia o cliente misterioso da campanha.
Apesar de não ter indícios de outros casos, o jornalista alemão acredita que essa não é uma campanha única, principalmente pelo volume de desinformação que passou a circular com a pandemia. “Foi apenas um caso em que eles foram pegos”, afirma Daniel Laufer.
Brasil
Em março deste ano, no Brasil, um outro caso foi alvo de polêmica, relacionando influenciadores e campanhas publicitárias. Mas dessa vez o cliente não era misterioso. A Agência Pública apurou que o Governo Federal destinou uma verba de R$ 1,3 milhões em patrocínio a influenciadores para a divulgação do “atendimento precoce” contra a Covid-19.
A campanha não trazia o termo “tratamento precoce”, mas, de acordo com Pública, os termos “atendimento” e “tratamento” são usados indiscriminadamente no site e nos comunicados do Ministério da Saúde. O alardeado tratamento precoce não é reconhecido pela Organização Mundial de Saúde.