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acervo pessoal

out 11, 2022 | Pontos de Vista

Como falar dessa eleição para as crianças sem lhes roubar a esperança

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Estamos na Semana das Crianças e hoje, Doze de Outubro, no dia delas, eu e meu raio problematizador não estaremos nadando numa piscina de bolinhas coloridas.

Há muito tempo eu milito, extraoficialmente, pela infância (alô marcas, mandem trabalhinhos). Uma parte das vulnerabilidades deste grupo social foi posta em meu colo a partir do momento em que me tornei mãe. E, vejam bem, não precisa ter filho para perceber e se incomodar com a forma como a infância é tratada, mas quando se tem ou quando se convive com certa intimidade com crianças, torna-se quase impossível que esse assunto não te ocupe.

Quando escrevi aqui para essa seção Pontos de Vista sobre Educação Digital, expus parte da minha dificuldade em criar um serumaninho neste mundo onde a desinformação, as fake news e o discurso de ódio nos atravessam sem muita possibilidade eficaz de filtro.

E a gente nem precisa do digital para se deparar com tudo isso, principalmente agora, neste período eleitoral. A desinformação chega analogicamente para nossas crianças.

E como tratar de política com essas pessoinhas que estão expostas às crenças, aos hábitos e valores de seus núcleos familiares?

Uns tempos atrás meu filho chegou em casa contando que um adulto havia dito a ele que política não era assunto para crianças. Na hora os meus divertidamente começaram a discutir colericamente e antes que eu desse um textão para o menino eu me lembrei de que aquele discurso era fundado na história de vida daquela pessoa e que essa história diferia da minha.

Quando eu tinha a idade que meu filho tem hoje política já era assunto na minha casa. Era a época das Diretas Já e lá estava eu rodeada pelas conversas dos adultos. Era a década de 80 e as escolas públicas viviam em greve. Eu ouvia minha mãe dizendo que iria fazer um piquete e tinha certeza que ela e os amigos dela estavam quinem os Thundercats contra Mumm-Ra. Foi, nesta época que eu aprendi a palavra pelego e era assim que eu chamava meus colegas que não se juntavam a mim para uma ida à Diretoria com um pedido de aumento de 10 minutos no tempo do recreio.

Entender o que formou nossas convicções políticas e saber criticá-las nos ajuda a dialogar com quem está no outro polo do pensamento. E, claro, quando digo aqui sobre compreender e buscar dialogar com grupos antagônicos não estou pedindo que sejamos tolerantes com discursos criminosos. Racismo, homofobia e atentar contra a democracia são crimes.

Lembrar da criança que fomos pode nos ajudar a dialogar com as crianças com as quais convivemos e afastá-las desta polarização raivosa e com argumentos tão empobrecidos.

Observar uma criança crescer deveria nos impor a necessidade e o desejo de falar sobre o mundo para ela sem lhe roubar a esperança.

Tratar as crianças como sujeitos de direito e não nos eximirmos da busca por informações confiáveis não deveriam ser esforços, mas o que percebo é que, nas relações com a infância, a desinformação se torna um lugar de conforto. Tem o conforto do não diálogo e tem também o conforto fundado no orgulho e na vaidade. Querem ver?

Vocês, mães e pais que estão me lendo, quantas vezes já tiveram suas escolhas criticadas por adultos mais velhos que, invariavelmente, lançam mão do que eu chamo de teoria do sobrevivente? Aposto que vocês já ouviram coisas do tipo: “Hum, mas meus filhos tomaram refrigerante na mamadeira e estão vivos” ou “frescura desta geração, com dois meses os meus filhos já comiam sopinha e estão aí cheios de vida”.

Me lembrei aqui e vou transcrever um trecho do texto escrito pelo médico Henrique Peixoto, publicado aqui mesmo no site do *desinformante: “Nossa ciência tem um compromisso com a verdade que faz com que se apoie nos dados consolidados até o presente, mas que podem ser desmentidos posteriormente por novos dados levantados. Isto não a desqualifica, pelo contrário, a torna dinâmica e potencialmente sujeita a aperfeiçoamento e correções.”

Aceitar que a ciência traz novidades sobre determinados comportamentos e afazeres da criação de um ser humano e replicar esse conhecimento parece nos colocar num lugar de falha. Do mesmo modo, ouvir o diferente e assumir que foi convencido pelo argumento do lado oposto se torna tão difícil.

A infância é para mim o maior incentivo para o exercício do diálogo, da autocrítica e da busca por informação confiável. Lydia Hortélio, educadora e estudiosa da cultura da infância, diz que “Se a humanidade tem futuro, ela vai retomar por aí: pela infância. ” Eu, com Dona Lydia, sigo pela revolução que falta: a revolução da infância.

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Paula Campos

Advogada com experiência na gestão pública e em organizações da sociedade civil, nas áreas da cultura e infância.
Interessada nos impactos políticos relacionados ao uso de mídias sociais. É coordenadora administrativa do *desinformante.

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