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Mikhail Nilov para Pexels

abr 26, 2022 | Destaques, Notícias

Mais da metade das jornalistas têm rotina impactada por ataques nas redes

Mikhail Nilov para Pexels
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Pesquisa da Gênero e Número e do Repórteres Sem Fronteiras (RSF), lançada nesta terça (26), mostra como desinformação e violência contra profissionais da imprensa têm repercutido na sua rotina. Oito em cada 10 jornalistas entrevistadas afirmaram ter mudado seu comportamento nas redes sociais nos últimos anos para se proteger de ataques, mais de 50% afirmaram que a proliferação de ataques nas redes contra a imprensa impactou sua rotina profissional e 15% relataram ter desenvolvido algum tipo de problema de saúde mental em decorrência dos ataques sofridos. Um quarto dos jornalistas que foram alvos de violência na internet afirma ter precisado fechar suas contas em redes sociais, ainda que temporariamente, para se proteger. Quando questionados sobre os efeitos diretos da desinformação sobre seu trabalho, mais da metade dos respondentes (54,9%) afirmaram que o fenômeno gera um impacto direto em sua rotina.

Realizada por meio de questionário online entre os dias 9 de agosto e 6 de setembro de 2021, a pesquisa “O impacto da desinformação e da violência política na internet contra jornalistas, comunicadoras e LGBT+” reúne dados da população de jornalistas de todas as regiões do Brasil, mais especificamente do grupo que dispõe de algum equipamento digital com acesso à internet. O levantamento de dados contou com 237 participantes e foi estruturado a partir de 3 eixos: Desinformação, Violência Online e Proteção e Plataformas.

Mais do que um alerta, o relatório traz uma constatação de que jornalistas têm sido frequentemente atacados/as, ameaçados/as e desqualificados/as — presencialmente ou em ambientes digitais. “O impacto da desinformação e da violência online no trabalho de jornalistas e comunicadoras no Brasil é brutal. Temos observado isso na Gênero e Número ao acompanhar o contexto político e da comunicação, em especial o que acontece no ambiente online”, avalia Giulliana Bianconi, codiretora da Gênero e Número.

Para 93% das jornalistas entrevistadas a desinformação é um fenômeno muito grave, e 55% avaliam que a desinformação tem um impacto cotidiano em suas rotinas profissionais. 86% das respondentes avaliam também que a violência online contra a imprensa é um efeito diretamente relacionado à desinformação.

“Os dados que estruturamos e analisamos mostram algo importante: jornalistas mulheres e LGBTs alteraram hábitos e formas de fazer seu trabalho numa tentativa de menos exposição. É alta a percepção de insegurança, e para a maioria dos respondentes o governo Bolsonaro acirrou o fenômeno da desinformação no Brasil, afetando a rotina de trabalho, a saúde e a vida pessoal dos jornalistas”, analisa a diretora de dados da GN e responsável pela metodologia da pesquisa, Natália Leão.

Metade dos jornalistas que responderam à pesquisa afirmam já terem sofrido algum tipo de violência devido ao exercício da profissão, e 8 em cada 10 afirmaram já terem presenciado alguma situação desse tipo com algum outro colega. Para dois terços dos que testemunharam violência contra colegas ou conhecidos há a percepção de que um episódio de violência resulta em novos ataques.

Entre os tipos de violência mais presentes, conteúdos com xingamentos ou palavras hostis aparecem em primeiro lugar (35%), seguido por ataque ao trabalho (34%) e desqualificação do trabalho realizado (33%). O terceiro grupo de violações mais frequentes são ataques misóginos ou com conotação sexual (19%), nos quais a agressão é direcionada diretamente à mulher jornalista, com objetivo de intimidar, desqualificar e gerar dano à sua reputação. Ameaças à reputação profissional e pessoal, à integridade física e uso indevido de imagens ou fotos também aparecem como crimes recorrentes contra jornalistas, mas em menor quantidade. Assim como doxxing, spoofing ou ataque devido à identidade de gênero ou orientação sexual, racismo e ameaças a familiares.

Políticos, entre eles, presidente da República, ministros, governadores, prefeitos, deputados, senadores e vereadores representam 8% dos casos de agressões reportadas pelos jornalistas vítimas de violência online na pesquisa. Apesar de parecer pequeno, este percentual reflete estudos que apontam para um cenário de institucionalização da violência contra jornalistas no Brasil, em que a hostilidade contra a imprensa é perpetrada desde o topo do poder executivo federal e é reproduzida por parte da sociedade.

Impacto da violência na rotina profissional

De maneira geral, os efeitos da violência online na rotina profissional se concretizam como outras formas de violações, impactando o direito de se expressar e desenvolver suas habilidades profissionais. 14% dos jornalistas que relataram ter sofrido algum tipo de ataque, passaram a evitar produzir conteúdos sobre determinados assuntos e 7% informaram que deixaram de cobrir algum tema ou editoria temporariamente.

Outro tipo de impacto observado é a invisibilização da própria identidade autoral. Com o objetivo de se proteger, 6% dos jornalistas expostos à violência online admitiram evitar se dar crédito ou assinar conteúdos com seu próprio nome; 8% dos jornalistas começaram a ter medo ou receio de recorrer a algumas fontes de informação e 3% informaram que fontes se recusaram a conceder entrevistas. Nesses casos há um duplo cerceamento do trabalho da imprensa como forma de evitar consequências dos ataques sofridos: por um lado, jornalistas evitam contactar fontes para se proteger – o que pode significar também deixam de fazer questionamentos relevantes para a sociedade para evitar ser atacado novamente -, por outro lado, para não ser alvo de ataques ou em retaliação aos jornalistas, fontes deixam de atender à imprensa.

Entre as pessoas que informaram terem sofrido violência online, 45% reconheceram os impactos disso em sua vida pessoal. A maioria informou dois ou mais efeitos em sua rotina fora do trabalho. Quase um quarto (24%) percebeu estar mais inseguro ou ansioso desde o episódio de violência vivido. Esse tipo de impacto está diretamente ligado ao bem estar emocional do indivíduo e também seu direito à liberdade de expressão.

“De modo geral entende-se que a censura se manifesta apenas pela interferência direta de agentes do Estado, com cerceamento explícito e direto da produção e livre circulação da atividade jornalística. A pesquisa evidencia como a deterioração do debate público, associada aqui à desinformação, à discursos estigmatizantes e ao assédio na internet, também passa a funcionar como mecanismo de pressão no exercício da atividade jornalística, operando em alguma medida como instrumento de censura e silenciamento”, declarou Emmanuel Colombié, diretor da RSF para a América Latina.

A violência online contra mulheres jornalistas é apontada como um fenômeno mundial. Uma pesquisa realizada em 2020 pela UNESCO e o Centro Internacional para Jornalistas (ICFJ), que contou com 900 respondentes de 125 países, afirmou que essa tendência “corrói os fundamentos do jornalismo, aumenta as ameaças à segurança jornalística e enfraquece a liberdade de expressão”. No Brasil, levantamentos recentes realizados pela Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo (Abraji) e pela própria RSF vêm alertando para a intensificação desse fenômeno no país. O Brasil ocupa a 111a posição, entre 180 países, no Ranking Mundial da Liberdade de Imprensa de 2021, elaborado anualmente pela Repórteres sem Fronteiras.

Este texto é uma produção da Agência Bori 

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