Executivos da Meta, TikTok, Snapchat, Discord e X (ex-Twitter) encararam hoje uma audiência no Senado norte-americano para responderem – e ouvirem bastante – sobre a (falta de) segurança de crianças e adolescentes nas suas plataformas. Congressistas questionaram os CEOs, frente a frente, sobre as políticas e os esforços das empresas. Na plateia, pais que perderam seus filhos por incidentes nas redes sociais assistiram a sabatina, clamando por mudanças e mais proteção.
No momento mais marcante das quatro horas de audiência, o CEO da Meta, Mark Zuckerberg, se levantou e se dirigiu aos familiares dos jovens e disse que “sente muito” pelo sofrimento das famílias e, para evitar que outras famílias passem pelo mesmo, a empresa investe e continuará investindo em segurança. As desculpas vieram após os questionamentos realizados pelo senador republicano Hawley, que cravou para Zuckerberg: “seu produto é um desastre para adolescentes”.
O senador retomou dados de pesquisas realizadas pela própria Meta para retrucar a fala inicial do CEO que disse que não existem indícios de que as mídias afetam a saúde mental de adolescentes. Documentos internos da empresa expostos pelo The Wall Street Journal mostram, por exemplo, que o Instagram faz com que distúrbios de imagens se tornem piores para um terço das garotas que usam.
Outro pedido de desculpas foi dado pelo CEO do Snapchat, Evan Spiegel. Na ocasião, a senadora democrata Laphonza Butler lembrou dos familiares das vítimas presentes e destacou a história de pelo menos dois jovens que morreram após consumirem drogas negociadas pelo Snapchat, especificamente fenatil, que vem matando cada vez mais norte-americanos. “Estamos devastados, sentimos muito por não prevenir essas tragédias”, disse Spiegel.
Durante a audiência, os representantes das big techs repetiram seus investimentos, políticas e medidas para evitar a exploração sexual de crianças online. A CEO do X, Linda Yaccarino, por exemplo, afirmou que a plataforma sofreu mudanças estruturais nas suas políticas após a aquisição por Elon Musk, e que a companhia é uma “nova empresa” que está 100% comprometida em ser parte da solução do problema e tem tolerância zero para abuso sexual de crianças.
O senador Lindsey Graham, no entanto, lembrou aos CEOs: “se essas medidas funcionassem, não estaríamos aqui”. Já o presidente do Comitê Judiciário do Senado, Dick Durbin, lembrou da “coincidência” de algumas plataformas, como X e Meta, terem anunciado medidas nas vésperas da audiência e destacou que o design delas, a busca constante pelos lucros e as falhas de investimento em segurança colocam as crianças em risco.
Moderação de conteúdo e verificação de idade
A moderação de conteúdo também esteve em pauta. O senador Thom Tillis questionou quantos profissionais atuavam moderando o material. De acordo com as informações dos CEOs, a Meta possui cerca de 40 mil moderadores em todo o mundo, assim como o TikTok. Já o X garantiu ter 2.300 moderadores de conteúdo e o Snapchat cerca de 2 mil. O Discord, como argumentou o CEO Jason Citron, possui uma arquitetura diferente para moderação e disse ter centenas de moderadores.
Controle parental, verificação de idade e privacidade foram outros temas abordados na audiência. O CEO da Meta reiterou em diversos momentos os mecanismos de proteção para crianças e sugeriu que a responsabilidade de algumas questões, como a verificação etária, fosse das lojas de aplicativos e não das próprias plataformas.
Documentos e e-mails vazados da Meta também foram utilizados nos questionamentos, assim como os próprios avisos da plataforma anunciando que os resultados de determinada busca poderiam conter imagens de abuso sexual infantil.
O presidente do comitê finalizou a sessão com a seguinte provocação:
“Rentabilidade a que custo? Nossa tecnologia é maior que nossa humanidade? Agora é hora de agir”.
presidente do Comitê Judiciário do Senado dos EUA, Dick Durbin
Leis para proteção dos jovens
A audiência aconteceu em meio ao debate de pelo menos cinco legislações que buscam uma maior proteção das crianças e adolescentes nas redes sociais. Os projetos foram aprovados por unanimidade no Comitê Judiciário do Senado. Porém, o tema, que une democratas e republicanos, não deve receber apoio das plataformas digitais. Diversos senadores usaram seu tempo de fala para questionar a posição das empresas em relação às legislações e as respostas foram, na sua maioria, uma variação de “precisamos debater mais” ou “ainda temos algumas preocupações quanto à implementação”.
As cinco leis aprovadas no comitê são:
- A Lei STOP CSAM, que apoia as vítimas e aumenta a responsabilização e a transparência das plataformas online, permitindo que as vítimas de exploração sexual online processassem plataformas de mídia social que promoveram ou facilitaram o abuso;
- A Lei EARN IT, que remove a imunidade geral da tecnologia em relação à responsabilidade civil e criminal, alterando a seção 230, e estabelece uma Comissão Nacional de Prevenção da Exploração Sexual Infantil Online;
- A Lei SHIELD, que garante que os promotores federais tenham ferramentas adequadas e eficazes para lidar com a distribuição não consensual de imagens sexuais;
- O Projecto Safe Childhood Act, que moderniza a investigação e a repressão de crimes de exploração infantil online; e,
- A Lei REPORT, que combate o aumento da exploração sexual infantil online, estabelecendo novas medidas para ajudar a fortalecer a denúncia desses crimes.
O intenso lobby das plataformas também foi lembrado por senadores durante a audiência, destacando como as empresas atuam contra a aprovação das leis. Além disso, o marco regulatório dos Estados Unidos, capitaneado pela seção 230 que prevê a imunidade das plataformas, foi amplamente lembrado e criticado pelos legisladores, que retomaram a necessidade de atualização dessa medida. “Estamos em 2024 e não tem uma lei para processar as maiores e mais lucrativas organizações”, disse o senador Graham.
Outra legislação que está em debate no Congresso norte-americano é a Kids Online Safety Act (KOSA). A lei, que é considerada controversa por especialistas, já havia recebido o apoio da Microsoft nesta semana e, durante a audiência, a CEO do X, Linda Yaccarino, também afirmou o apoio à medida regulatória. As outras plataformas não se manifestaram nesse sentido.