“Este é um momento decisivo para o mundo”. Essa é a análise de mais de 50 acadêmicos e especialistas de todo o mundo sobre o bloqueio do X no Brasil e as investidas do seu dono, o bilionário Elon Musk, contra o país. Renomados intelectuais assinaram uma carta para “expressar nossa profunda preocupação com os ataques em andamento por parte das Big Techs e seus aliados contra a soberania digital do Brasil”.
Para os signatários, a disputa do Judiciário brasileiro com Elon Musk é “o mais recente exemplo de um esforço mais amplo para restringir a capacidade das nações soberanas de definir uma agenda de desenvolvimento digital livre do controle de megacorporações sediadas nos Estados Unidos”.
O grupo de acadêmicos inclui importantes economistas, como Gabriel Zucman, Julia Cagé, Thomas Piketty, Francesca Bria, David Adler, Daron Acemoglu e Jayati Ghosh. O documento também reúne nomes como Nick Couldry, professor da London School of Economics and Political Science; Nick Srnicek, professor e autor de “Capitalismo de plataformas”; José Van Dijck, pesquisadora e autora de “The platform society”; e Evgeny Morozov, autor de “Big Tech: a ascensão dos dados e a morte da política”.
A carta enaltece a intenção do governo brasileiro de buscar independência digital diminuindo a dependência do país de entidades estrangeiras e promovendo o desenvolvimento de ecossistemas tecnológicos locais. “De acordo com esses objetivos, o estado brasileiro também pretende forçar as Big Techs a pagar impostos justos, cumprir as leis locais e ser responsabilizadas pelas externalidades sociais de seus modelos de negócios, que muitas vezes promovem violência e desigualdade”, coloca a carta.
Esses objetivos, avaliam os intelectuais, são recebidos com ataques do proprietário da X e de líderes de direita que reclamam sobre democracia e liberdade de expressão. “Além disso, a plataforma X e outras empresas começaram a se organizar, junto com seus aliados dentro e fora do país, para minar iniciativas que visam a autonomia tecnológica do Brasil. Mais do que um aviso ao Brasil, suas ações enviam uma mensagem preocupante ao mundo: que países democráticos que buscam independência da dominação das Big Tech correm o risco de sofrerem interrupções em suas democracias, com algumas Big Techs apoiando movimentos e partidos de extrema-direita”, pontuam os acadêmicos.
Para eles, o caso brasileiro tornou-se o “principal front no conflito global em evolução entre as corporações digitais e aqueles que buscam construir um cenário digital democrático e centrado nas pessoas, focado no desenvolvimento social e econômico”. Os autores reforçam que, quando os interesses financeiros estão em jogo, as plataformas trabalham “alegremente” com governos autoritários.
Por fim, o documento pede que o governo brasileiro seja firme na implementação de sua agenda digital e denuncie as pressões contra ela. “O sistema ONU e os governos ao redor do mundo devem apoiar esses esforços”, complementam. “Há também uma necessidade urgente de desenvolver, dentro do marco da ONU, os princípios básicos de regulamentação transnacional para o acesso e uso de serviços digitais, promovendo ecossistemas digitais que coloquem as pessoas e o planeta à frente dos lucros, para que esse campo de provas das Big Techs não se torne uma prática comum em outros territórios”, finalizam.
Também assinam a carta os brasileiros José Graziano, ex-diretor-geral da Organização das Nações Unidas para Alimentação e Agricultura, e professores e pesquisadores como Helena Martins, da Universidade Federal do Ceará, Marcos Dantas, da Universidade Federal do Rio de Janeiro, e Sergio Amadeu da Silveira, da Universidade Federal do ABC.
Leia abaixo a carta na íntegra: