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abr 18, 2024 | destaques, notícias

Deputados norte-americanos divulgam mais de 80 decisões sigilosas da Justiça brasileira dirigidas a redes sociais

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O Comitê Judiciário da Câmara dos Deputados dos Estados Unidos divulgou nesta quarta-feira (17) mais de 80 decisões sigilosas do Tribunal Superior Eleitoral e do Superior Tribunal Federal para remoção de conteúdo e de contas entre 2021 e 2024. O relatório, de 541 páginas, possui 51 ordens emitidas pelo ministro Alexandre de Moraes para a plataforma X (ex-Twitter) e outras 37 ordens emitidas pelo TSE. O vazamento das decisões se deu uma semana após Elon Musk, dono do X, ameaçar não cumprir decisões judiciais brasileiras e divulgá-las, além de atacar o ministro Alexandre de Moraes. A própria defesa do X no Brasil havia comunicado, no dia 13 de abril, que a sede da empresa tinha enviado ao Congresso norte-americano um compilado das decisões de Moraes.

O comitê que divulgou o relatório é liderado por republicanos e presidido por Jim Jordan, deputado extremista do estado de Ohio e que foi um ator importante nas tentativas de Trump de derrubar a vitória de Joe Biden. No texto, o comitê discute o “silêncio da administração Biden” em relação aos “ataques à liberdade de expressão” no exterior, com foco no Brasil, e diz que o documento demonstra a “censura governamental” em decisões que visam o combate à desinformação. Em julho do ano passado, o jornal The Guardian já havia mostrado como os congressistas nos EUA estão levantando a campanha ‘desinformação versus liberdade de expressão’ e como Jordan vinha perseguindo universidades e pesquisadores que abordam o tema da desinformação.

“Moraes atacou críticos tanto da direita quanto da esquerda com impunidade. Moraes supostamente ordenou que plataformas de mídia social removessem postagens e contas, mesmo quando ‘muito do conteúdo não violava as regras das empresas’ e frequentemente sem fornecer um motivo”, alega o texto em uma tentativa de denunciar a a ausência de fundamentação nas decisões. 

O Supremo Tribunal Federal se manifestou, explicando que os conteúdos divulgados pelos deputados dos EUA não são as decisões fundamentadas que determinam a retirada de conteúdo e de perfis, mas são os ofícios enviados às plataformas para o cumprimento da decisão. O Supremo também esclareceu que todas as decisões tomadas pela Corte são fundamentadas, como prevê a Constituição Federal, e as partes têm acesso a essa fundamentação.

O professor de direito da Universidade de São Paulo, Rafael Mafei, explicou a diferença entre decisões e ofícios, destacando que “são apenas a determinação burocrática do cumprimento de uma decisão exarada anteriormente. Como regra, é na decisão, e não no ofício, que se encontra a fundamentação”:

O relatório – sem diferenciar os poderes – também diz que o “governo brasileiro” está tentando “censurar” mais de 300 contas, tanto no X como em outras plataformas digitais – as decisões envolvem, além do X, contas no Instagram, TikTok, YouTube, Rumble, Kwai, Gettr, Facebook e Telegram.

Essas contas, de acordo com o relatório, trazem atores do Judiciário (como a juíza Ludmila Grilo), do jornalismo (como Rodrigo Constantino e Guilherme Fiuza) e da “oposição política” ao atual governo, como Jair Bolsonaro, ex-presidente que ostenta uma decisão judicial em seu desfavor: a remoção de conteúdo com propaganda irregular durante as eleições de 2022. 

Algumas das decisões que estavam em sigilo determinam, por exemplo, a retirada de conteúdos desinformativos que alegam fraudes em urnas eletrônicas, como a live de transmissão do influenciador argentino Fernando Cerimedo em novembro de 2022. Essa decisão foi tomada por Marco Vargas, juiz auxiliar da presidência da Corte:

Trecho dos ofícios divulgados pelo comitê do Congresso dos EUA

No entanto, o próprio relatório também traz uma decisão de janeiro de 2023, do ministro Alexandre de Moraes, que determina a reativação das contas de Cerimedo:

Trecho dos ofícios divulgados pelo comitê do Congresso dos EUA

Há também decisões sobre a remoção de perfis envolvidos na disseminação de desinformação e celebração dos atos golpistas do dia 8 de janeiro. No dia 11 de janeiro de 2023, por exemplo, o juiz Marco Veiga determinou a remoção de grupos e perfis no Twitter, Telegram e Facebook considerando que “é evidente que as postagens possuem potencial para tumultuar o cenário político, na medida em que explicitamente incentivam comportamentos ilegais e beligerantes, atraindo, como consequência, a possibilidade de novas ocorrências ou episódios violentos, como os ocorridos em 8 de janeiro”.

Um levantamento da Folha de S. Paulo mostra que pelo menos 77 decisões pela derrubada de perfis em 2022 foram tomadas no âmbito do STF. Já em 2023, 136 contas foram suspensas por ordem de Moraes (uma pessoa pode ter mais de uma conta em diferentes plataformas). “Do total relativo a 2023, 107 perfis foram derrubados entre janeiro e março, o que demonstra que a atuação do ministro se intensificou logo após os atos golpistas de 8 de janeiro”, diz a Folha.

O ICL Notícias também levantou os documentos publicados e destacou que eles trazem à tona crimes de extremistas brasileiros. O relatório mostra, por exemplo, que o telefone do ministro Alexandre de Moraes foi vazado na internet e que ele passou a receber “diversas ligações de cunho ofensivo e ameaças”, inclusive do influencer da extrema direita, Allan dos Santos.

Alguns dos documentos publicados no relatório do Comitê trazem marcas d’água que mostram de forma expressa que aquele documento era uma cópia enviada ao Twitter, outros demonstram que aquela cópia deveria ser enviada à Polícia Federal. Já outros não trazem marcas d’água, mas possuem um selo que deveria ser algo confidencial.

Trecho dos ofícios divulgados pelo comitê do Congresso dos EUA

Relatório busca associar censura no Brasil com os EUA

O relatório busca fazer uma comparação da suposta censura no Brasil com os Estados Unidos: “A censura governamental não é exclusiva de governos autoritários em lugares distantes; está ocorrendo aqui nos Estados Unidos. O Comitê e a Subcomissão Selecionada descobriram que a administração Biden, assim como o Brasil, procurou silenciar os críticos”, diz o texto.

O documento ainda coloca como se fosse papel dos Estados Unidos interferir no Brasil com o que eles veem como “censura do discurso online”. “O Departamento de Estado tem um Escritório do Subsecretário para Segurança Civil, Democracia e Direitos Humanos para ‘avançar a segurança do povo americano ajudando países ao redor do mundo a construir sociedades mais democráticas, seguras, estáveis e justas’. Sob a Administração Biden, o Departamento tem ficado notavelmente em silêncio enquanto o Brasil e outros países procuraram censurar o discurso online”. O relatório ainda diz que o Congresso norte-americano precisa, mais do que nunca, agir. 

A advogada Flávia Lefèvre reagiu abordando o posicionamento do X e de “forças da ultradireita” – como os deputados que publicaram o relatório – na tentativa de “desestabilizar as instituições democráticas e a soberania nacional”.

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